Opinião

Mundo vasto de incertezas 

4 de maio de 2024

Foto: Reprodução

ESDRAS AZARIAS DE CAMPOS

“Mundo, mundo, vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução”. Com esta estrofe do poema de Sete Faces, do nosso saudoso poeta maior, Drummond de Andrade, remete-nos à reflexão de que a humanidade erra mais do que acerta. E não é necessário aprofundar muito na história para percebermos tal evidência. Para início de análise basta apontar a existência das guerras ou então da manutenção das organizações sociais com distinção de classes variando de ricos minoria, pobres e miseráveis maioria. São dez mil anos de civilização e os humanos nunca pararam de guerrear por um dia sequer e a questão social continua no mesmo modelo do estrato tradicional com a divisão das classes sociais.

Vivenciamos uma desesperança que está vencendo a garra humana com a qual temos mantido a nossa sobrevivência pelos séculos passados? As causas e razões são várias a começar pelo já arcaico sistema socioeconômico e político capitalista. O sistema capitalista que se iniciou na Baixa Idade Média e se firmou a partir do século XV, foi um avanço ao substituir o sistema feudal e proporcionou revoluções comerciais e industriais e aumento da urbanização. Revolucionou os sistemas de comunicação e transportes, enfim trouxe o que chamamos de progresso. Mas por outro lado o sistema capitalista trouxe também o germe de sua autodestruição: a busca do lucro pelo lucro a qualquer custo, a concentração de riquezas em uma só classe social e a contradição entre capital versus trabalho. Todo esse processo desencadeou a própria ruína do sistema devido a incapacidade de trazer o progresso para todas as nações e povos. Aliás, até pelo contrário, provocou a concorrência desenfreada entre nações capitalistas para domínio do mercado internacional. Tais rivalidades no século XX foram causas de duas guerras mundiais, com perdas de mais de sessenta milhões de vidas humanas. Se contarmos guerras localizadas para manutenção do domínio geopolítico no 3º. Mundo, podemos chegar ao absurdo número de cem milhões de mortos. O capitalismo está morrendo e deverá ter seu fim lá pela segunda metade do presente século!

Além das guerras há outros fatores a demonstrar a falência da sociedade capitalista mundial. Sucessivas crises cíclicas econômicas do mercado mundial já evidenciam a tendência de queda na taxa dos lucros e o capitalismo sem lucros não tem como existir. Outro sinal impactante de decadência é a gigantesca dívida global, que alcançou 275 trilhões de dólares em 2020 em dívidas governamentais, corporativas e domésticas, quase três vezes o Produto Bruto Mundial, que se constitui em uma bomba prestes a explodir. E tal processo decadente reflete negativamente em todos os sentidos da sociedade humana, ou seja, tanto nos aspectos coletivos ou individuais e sobretudo psicológicos.

Vivenciamos outra era do medo e insegurança e por isso há um recrudescimento mundial na busca de governos autoritários de ideologia neofascista, um campo minado para polarizações ideológicas conflitantes com lideranças oportunistas com viés religioso assumindo papéis de salvadores da pátria. E este é mais um caminho equivocado como solução. O caro leitor já deve ter sentenciado: quanto pessimismo num texto tão curto.

Sim, é verdade, mas como ser otimista diante deste dantesco estado de coisas deploráveis? Fugir ou escamotear a verdade é aceitar resignado que o mundo é assim mesmo e a saída só depois da morte, com a esperança de recompensa em ir para uma morada celestial.

Há luz no fim do túnel? A própria história nos ensina que a cada época turbulenta da humanidade, no fim do túnel sempre apareceu uma luz ainda que tênue, mas suficiente para manter a marcha humana em busca da sua afirmação como a espécie animal dotada de inteligência, razão e consciência. E qualquer alternativa ao capitalismo terá de vir arraigada de humanismo, se não, continuará a tragédia humana!

ESDRAS AZARIAS DE CAMPOS é Professor de História