Opinião

Brioches à vista                         

22 de abril de 2024

LUIZ GONZAGA FENELON NEGRINHO

É costume tirar meia hora do café da manhã para conversar com a secretária, por quem tenho estima. Em geral, assuntos ligados ao escritório. Na medida do esperado, importantes e necessários para serem tratados e absorvidos num dia que promete ser melhor que o anterior.
Mais por delicadeza do que qualquer outro motivo, ela senta-se à minha frente, atende ao chamado, embora perceba pelo seu olhar nem sempre concorda com o que eu digo, o que acho justo e perdoável.
Estendo-me em ideias programáticas e pragmáticas, verdade seja dita, um saco. Nem sei ao certo com que intenção vou adiante com os temas em pauta. Sim pelo não, vou despejando o que avalio como relevante, ao que depois percebo, retórica vazia e inútil.
Ao cabo de um provável (o certo seria reprovável) desabafo, sinto que ela opta por perguntar se quero café com pão e bolachas, o que agradeço.
Ante tantos planos para nenhuma utilidade, o mais certo seriam os brioches. Mais encantador pelo frenesi do nada, o pãozinho leve, de origem francesa, até que cairia bem e no aceitável pelo desconforto de ocasião.
Onde estou com a cabeça. A secretária não é paga para ouvir desabafos e tampouco desaforos. Como de resto, nem a mim interessa cuidar do visivelmente desnecessário. Logo eu, emissor de angustiantes abobrinhas. No que ouso tomar tais conversas e desarvorados assuntos como pauta de reunião. Reunião de quê? Trato sempre do mesmo assunto: dar resposta rápida a quem dela precisa. E pelo ruído na antessala há gente aguardando. Como então dar resposta na ligeireza?
E mais: o que a secretária tem a ver com a noite mal dormida, os desencantos frustrantes que me cercam, os desacertos diários? Absolutamente nada. Uma inconveniência absoluta.
Melhor e menos perigoso é ficar no desalento do descompasso humano. Ainda que num incômodo de não cuidar de ofertar a ninguém mais do que as tão prometidas respostas. Tanto faz. Café com pão e manteiga, mesmo os brioches, não seriam de todo ruim. Melhor é esperar por melhores dias, bem sei, não sei quando e se de fato virão.
Querem saber: adeus aos brioches. Melhor é deixar a secretária em paz e aguardar o café com pão e manteiga na esperança de que o dia seja menos pior do que o vindouro, na esperança de que a angústia da espera na antessala não supere à do titular.
LUIZ GONZAGA FENELON NEGRINHO, advogado, escreve aos domingos nesta coluna.(luizgfnegrinho@gmail.com)