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Tá nervoso? Vai pescar…

PATRÍCIA LOPES PEREIRA SANTOS

Venho de uma família de insones, escapa um ou outro felizardo, mas a maioria dos meus queridos possuem em comum a luta com os travesseiros.
Conhecemos o stress de passar as noites olhando para o relógio, rolando de um lado para o outro, brigando com a sensação fake de nossas bexigas cheias, angustiados por termos que cumprir as obrigações do dia seguinte com o corpo e a cabeça, certamente, cansados pela ressaca de sono
A tensão da vigília já é o suficiente para espantar o sono, e já tentei algumas técnicas para adormecer, dentre elas cuidar da alimentação noturna e ler o ADCT da Constituição Federal de 1988 muito bem acomodada entre os lençóis, mas os meus olhos continuavam alertas.
Cada um dos meus queridos desenvolveu sua própria maneira para dormir, alguns optaram pela química, que, aliás, é infalível, não fosse a letargia de raciocínio da manhã seguinte. Outros, assumiram a insônia e começaram a se levantar naquela hora em que os pássaros cantam e os bebês choram, de madrugadinha, quando a maioria ainda usufrui do sono REM.
Enfim, além de ser uma chatice escutar os roncos alheios, uma boa noite de sono revigora o corpo, a mente e a alma, não é à toa que o raiar do dia é a metáfora para o recomeço.
Eu também precisava encontrar meu caminho para dormir, e urgente.
Então, supostamente inventei uma tática infalível, que consistia em concentrar em mim mesma e ficar presente no Aqui e no Agora.
Com a respiração pausada e ritmada visitava em pensamento cada partícula do meu corpo molengo sobre a cama, e após atingir uma boa consciência corporal embarcava numa deliciosa pescaria com o vovô Chico Tacheiro, e eu pescava um, dois, três…. peixinhos, até adormecer.
A viagem era, e sempre será, para o mesmo lugar, um flutuante na margem das três Ilhas ; o som da água enfeitado por um grito de pássaro, o sol se despedindo, o cheiro da lata enferrujada com suas minhocas inquietas e o tapete de taboas compunham o meu cenário cinco estrelas.
Nas minhas pescarias com vovô Chico experimento a paciência para fisgar o peixe, o silêncio para não afugentá-lo e o incentivo para, a despeito da incerteza da pesca, não desistir.
Então percebo que junto com a arte de pescar- que não aprendi-, vovô me ensina sobre a vida- que desejo aprender-.
E assim sigo, insistente, persistente, tentando ser disciplinada e assídua nas aulas, e quando a vida traz a sua prova e bate um medo, o sorriso humilde do vovô Chico me diz: “Siga em frente”
A propósito, a técnica descrita não fui eu quem a inventou, chama-se meditação e os monges já a praticam há milênios.
Hoje sofro bem menos de insônia, um pouco porque absorvi os princípios da pesca, e muito porque no final do dia estou exausta de tanto correr atrás de uma criança sedenta por desbravar o mundo.
Está aí mais uma ótima dica contra insônia. Neste caso, infalível.

PATRÍCIA LOPES PEREIRA SANTOS, graduada em odontologia (PUCMG) e direito (Fadipa), mestre em Políticas Públicas e Desenvolvimento Regional (Unifacef- Franca) e Especialista em Direito Público (Faculdade Newton de Paiva), é servidora pública do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. E-mail: acitripa70@ gmail.com

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