Opinião

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11 de dezembro de 2023

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho

“Perguntas idiotas, tolerância zero”

Para o bom juiz, antes de tudo, é preciso deixar as diferenças políticas e ideológicas de lado e não permitir que a postura de julgador se misture com interesses desse ou daquele governo. Trivialíssimo para a boa compreensão humana.

Por mais se acredite que assim seja, é preciso deixar claro que um juiz é um homem como outro qualquer, embora na condição de magistrado deva manter a ética profissional que exige isenção e discrição, bem diferente dos embates políticos. Mas um juiz não pode ser manietado a ponto de não poder torcer para um time de futebol, participar de um churrasco, não ter suas convicções religiosas, ideológicas etc. Quanto a demonstrar é outra história. Uma coisa é a prática e outra o discurso. Não pode haver incoerência.

Estamos nos referindo especificamente ao atual ministro da Justiça e Segurança Pública do Brasil, do governo Lula e senador pelo estado do Maranhão, do qual também foi governador entre 2015 e 2022, Flávio Dino de Castro e Costa (PSB-MA). Na condição de indicado para uma vaga ao Supremo Tribunal Federal (STF) à vaga da Rosa Weber que presidia o STF e se aposentou em setembro passado, vem sofrendo duros golpes antes mesmo da sabatina marcada para a próxima quarta-feira (13). Se vai passar, são outros quinhentos, outra história.

Conhecido no mundo político, Flávio Dino traz na bagagem um currículo invejável, que o qualifica ao que chamam de “notório saber”. Expressão que permite avaliar quem sabe muito pelo reconhecimento da experiência obtida fora das universidades e centros de pesquisa. Antigamente era difícil avaliar o quesito “notório saber”.

Hoje, não. É fácil. Com a evolução tecnológica, a comunicação à distância se tornou realidade. É possível, nos dias de hoje, saber quem é quem num simples apertar de botões. A menos que um deputado trapalhão e que não sabe o significado da plataforma Jusbrasil se meta em encrenca de graça, no imperdoável, valendo a duplicidade de sentido para graça.

Inesquecível a audiência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do dia 28 de março deste ano. No centro das atenções: o ministro Flávio Dino. Era para prestar esclarecimentos sobre a nova política de regularização de armas, ações sobre atos golpistas de 8 de janeiro e visita ao Complexo da Maré, no Rio. O deputado federal André Fernandes (PL-CE) desconhecia o que seja Jusbrasil e para que serve.

Quando se colocou numa pixotagem de lascar o cano ao dizer que Dino respondia a 277 processos. Em seguida tomou singela aula do sabatinado ministro da justiça. Não perdendo tempo, explicou que não respondia a nenhum processo e tirou uma lasquinha, comparando o método de pesquisas relatado com a crença no terraplanismo. Assim: “Mesmo continente mental de quem acha que a Terra é plana”.

Muitos não gostaram, a partir de então tacham o ministro de ‘beligerante’, algo a ver com a guerra. De beligerante Dino não tem nada. É uma figura agradável. Bonachão por excelência. Seu ‘defeito’ talvez seja saber muito. A não ser que levem em conta que o mestre em direito, professor, ex-juiz, senador, ministro de Estado, ex-governador, enfim, triunfos múltiplos que coroam uma belíssima carreira nos Três Poderes, possam credenciá-lo, aí sim, à ‘beligerante’ postura do saudoso ‘Seu Saraiva’, personagem vivido por Francisco Milani. Quem se lembra? Para quem “perguntas idiotas, tolerância zero”, bordão que consagrou a carreira do humorista nascido no Belenzinho, em São Paulo.

Ainda que o governo Lula apresente altos e baixos em seu terceiro mandato, temos por dever de cuidado atentar para o fato de que o presidente Lula escolheu o ministro Flávio Dino para ocupar uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). É ato político, sim. Poderia ter escolhido outro. Assim como também o fez em relação ao vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gonet, para o cargo de procurador-geral da República (PGR).
Do que mesmo a direita radical brasileira tem medo? Ora, pois. Dos onze ministros da maior instância do poder judiciário, o

ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) indicou dois para a Suprema Corte: Nunes Marques e André Mendonça. Sua primeira indicação se deu em 1º de outubro de 2020. E agora, de acordo com o inciso III do art. 52 da Constituição da República, entre outros, compete privativamente ao Senado Federal aprovar a escolha de magistrados, como do STF e Procurador-Geral da República. Após a sabatina, votação secreta. Nada mais natural. São as regras do jogo.

Aguarda-se que o nível dos trabalhos seja elevado, tranquilo e sereno. Quando dos questionamentos, não incorram em erros grosseiros e primários. Não confundir, por exemplo, Gonet com Gounod, este parceiro de Sebastian Bach na belíssima e suprema composição musical, a mais linda versão musicada de uma oração. Caso contrário: Ave Maria!

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.com)