27 de fevereiro de 2025
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Gilberto Almeida
“A desordem da cidade reflete a desordem dos que a governam.”
Nicolau Maquiavel
A realização de uma despesa pública deve obrigatoriamente cumprir etapas: Fixação, Empenho, Liquidação e Pagamento, conforme estabelece a Lei nº 4.320/64.
A FIXAÇÃO da despesa tem origem na elaboração e se estabelece na aprovação e sanção da Lei do Orçamento Anual (LOA), fixando os valores destinados a cada unidade administrativa, atividades e projetos, bem como a forma de aplicação dos recursos públicos. Após a licitação e assinatura do contrato, segue-se a etapa do EMPENHO, no qual o gestor aloca uma parcela dos valores fixados para garantir a realização daquela despesa, criando assim uma obrigação de pagamento para a Administração Pública. Emitida a ordem de serviço ou de fornecimento, o contratado inicia sua prestação de serviços ou entrega de mercadorias.
A LIQUIDAÇÃO DA DESPESA, foco principal desta coluna, é o momento crucial do processo pois neste momento a Administração verifica e atesta que o contratado cumpriu integralmente as exigências contratuais e que ela recebeu aquilo que comprou inclusive os serviços contratados. Isso ocorre por meio da conferência de produtos no almoxarifado ou da inspeção da prestação do serviço pelo responsável formal do contrato. Quando isso se confirma, a despesa é considerada liquidada, e um agente público atesta tal fato ao assinar em campo específico da nota de empenho. Esse é um pré-requisito para a etapa final, o PAGAMENTO, quando o valor correspondente é repassado ao contratado.
Feito esse prefácio técnico, aplico essa explicação a um gravíssimo problema que Passos enfrentou nos últimos tempos: as deficiências na coleta de lixo. Acompanho de perto os fatos da cidade há quarenta anos e, em todo esse período, nunca houve uma gestão tão desmazelada a ponto de deixar a cidade tomada por lixo amontoado em todos os cantos. O Excelentíssimo Senhor Doutor Prefeito Diego Rodrigo de Oliveira merece, com toda justiça, o título de gestor mais desasseado das últimas décadas. A completa avacalhação administrativa, condenou a cidade a condições insalubres, mau cheiro, infestação de animais peçonhentos, insetos e escorpiões, e agravou a epidemia de dengue pela imundície generalizada que sempre será debitada à inapetência administrativa dos atuais gestores.
Segundo afirmou o prefeito em uma entrevista a um de seus credenciados, os problemas com os serviços ocorreram, porque a empresa contratada deveria operar com cinco caminhões, mas utilizava apenas dois. A pergunta que não quer calar: os valores pagos foram integrais, como se todo o equipamento estivesse trabalhando? E para que esses pagamentos fossem realizados, quem foi o responsável por liquidar a despesa? Ou seja, quem foi a pessoa que atestou que a empresa cumpriu completamente o contrato, fazendo jus a receber todo o valor por um serviço que não foi integralmente prestado, deixando a cidade com lixo esparramado por toda parte?
Atestar de forma incorreta a execução de um serviço pode configurar uma irregularidade gravíssima que lesou os cofres municipais.
Por outro lado, se a liquidação da despesa não foi realizada de maneira integral, formalizando o descumprimento contratual, quais medidas foram tomadas como manda a lei? A omissão diante dessa irregularidade pode configurar prevaricação, merecendo uma grave reprimenda dos órgãos fiscalizadores, incluindo o Ministério Público e o Tribunal de Contas. Infelizmente, o Legislativo Municipal e a maior parte da imprensa local estão umbilicalmente ligados à Administração, comprometendo uma fiscalização independente.
Mesmo com a tardia rescisão do contrato e a contratação emergencial de outra empresa, essa questão precisa ser apurada para dissipar qualquer dúvida sobre a razão de tamanha demora e do caos provocado. Foi apenas incompetência administrativa ou havia algum compadrio com a empresa anterior? Não acredito nessa última hipótese, mas é inegável que essa empresa, por suas características, em tese não poderia ter sido habilitada para uma licitação da magnitude da coleta de lixo em Passos.
Espero, em primeiro lugar, que o Ministério Público atue em defesa da população e da aplicação de recursos públicos adequadamente e também que a cidade finalmente se veja livre desse problema. Entretanto, é imprescindível que a prefeitura, que agora contratou uma empresa por dispensa de licitação com prazo de seis meses, efetivamente realize um novo certame. Como a licitação da coleta de lixo exige um alto grau de complexidade, deixo aqui uma sugestão ao nobre alcaide: que não permita que seus assessores se acomodem com o alívio momentâneo e iniciem, desde já, os preparativos para a realização da licitação definitiva o quanto antes.