ESDRAS AZARIAS DE CAMPOS
Grande parte das invenções humanas vem para o bem e infelizmente, em muitos casos também servem para o mal. Senão vejamos. A última grande invenção é sem dúvida a “Internet”, complexa rede social que democratizou a comunicação de forma abrangente, porque todas as classes sociais têm acesso às redes através de um simples celular. Sim, claro, não foram abolidas as diferenças sociais, pois o mercado do ramo das comunicações via redes sociais reflete as contradições sociais no quesito nível aquisitivo, que vai desde a aquisição de um simples celular a um “iFone “que pode custar vários salários de um trabalhador das chamadas classes inferiores. Também porque a Internet é dominada por provedores que cobram por seus serviços. Mas, o que podemos apontar de mais deletério nas redes sociais, que confirma a tese do mau uso de uma invenção de tal magnitude, são as fake news, ou seja, as falsas informações se sobrepondo à verdade! Para cada informação verdadeira, existem milhões de falsas informações. E por mais inacreditável que for a fake news, mais compartilhada ela será e em poucos minutos será lida ou vista por milhões de usuários pelo país e mundo afora. Sem dúvida o mau uso da internet pode ser considerado o mal do século, ela é utilizada neste sentido na política, nas relações humanas e até na religião.
Para exemplificar a tese vejam o caso da confusão deliberada ou por ignorância, sobre a cena teatral apresentada nas festividades de abertura das Olimpíadas de Paris-2024, com a pantomima inspirada na pintura feita em óleo que mostra o Olimpo, onde os deuses estão reunidos em um banquete que celebra o casamento de Tétis e Peleu. Em destaque na cena o deus Apolo coroado ao centro. E, portanto, não se trata de ironizar a cena do quadro “da última ceia de Cristo” (1498), de Leonardo Da Vinci.
Segundo o responsável pela performance da pantomima, Thomas Jolly, trata-se de Dionísio (ou Baco), o deus do vinho e das festividades. Existem várias obras sobre esta temática. Mas duas em especial serviram de inspiração: “A Festa de Baco” (1514) pelo renascentista italiano Giovanni Bellini e a “Festa dos deuses” (1630) do pintor holandês Jan Harmensz van Bijlert..
A falsa polêmica começou devido a denúncia de alguns bispos católicos franceses que confundiram a pantomima que é representação da “festa de Baco” como se fosse a cena da “ceia de Cristo”. De nada adiantou o comunicado do artista responsável, de que se tratava de representação da mitologia greco-romana, até pediu desculpa por ter levado pessoas a se enganarem com a sua obra de arte. Mas enfim, tal engano se politizou com políticos da direita e até alguns da esquerda fazendo coro com a confusão dos bispos. Ganhou as redes sociais, a mídia internacional e pior, depois dos esclarecimentos continuam batendo na tecla de que houve profundo desrespeito à religião cristã, o que provocou retaliações cristãs-evangélicas e católicas pelo mundo afora.
No Brasil, tanto de parte da imprensa como nas redes sociais continuam viralizando o engano dos bispos franceses. E tal fato tem servido para muitos padres, pastores e tantos outros religiosos fazerem um verdadeiro alvoroço culpando até as Olimpíadas pelo “sacrilégio cometido”. Nas redes sociais a cada minuto tem alguém postando o famoso quadro da “Última ceia de Cristo” de Da Vinci, como desagravo para mostrar ao mundo e a todos a verdadeira cena cristã. Sobre Leonardo Da Vinci é interessante saber que além ser um dos maiores gênios da humanidade em várias atividades artísticas e científicas, ficou mais conhecido como pintor, mas como artista fazia suas obras por encomendas. Entre seus maiores clientes estava a Igreja Católica. E o grande Da Vinci, não pintou obras sacras por inspiração espiritual religiosa, mas como um artesão contratado e orientado para execução de um determinado trabalho. Além do mais, Da Vinci nem se preocupou em utilizar modelos europeus brancos, loiros de olhos azuis para compor os treze personagens na cena da sagrada Ceia, exceto um, o palestino típico (preto), Judas o traidor! Racismo? Hoje em dia, diante de uma informação nas redes sociais e até mesmo na mídia surge a dúvida atroz, verdade ou mentira?
ESDRAS AZARIAS DE CAMPOS é Professor de História