Opinião

STF supera próprios limites com anistia dos delitos de corrupção do caso Odebrecht

28 de maio de 2024

Foto: Reprodução

J. R. GUZZO

 

O direito universal deve ao Supremo Tribunal Federal do Brasil, dentre outros fenômenos do novo direito transconstitucional, o flagrante perpétuo. Deve, também, o julgamento em todas as instâncias de uma vez só – de maneira que o sujeito não pode recorrer a ninguém da sentença recebida. Deve a prisão preventiva por tempo indeterminado. Deve a inversão do princípio da prova – é o réu que tem a obrigação de provar a sua inocência, e não o acusador que tem de provar a culpa. Deve a instalação, dentro da suprema corte constitucional do Brasil, da “maior vara penal do mundo”, com não menos de 2.000 processos. Passa a dever, agora, a anistia ampla, geral e irrestrita para todos os crimes de corrupção, ativa ou passiva – mesmo com a confissão dos criminosos e a devolução de dinheiro roubado.

Anistia, desde a Grécia antiga, é o perdão, ou o esquecimento, de crimes políticos. O STF ampliou esse conceito. O perdão passou a incluir a roubalheira – enquanto o mesmo STF insiste que não pode existir a possibilidade de anistia para os crimes políticos de que não gosta. O quebra-quebra do 8 de janeiro de 2023, por exemplo, não pode ser anistiado até o dia do Juízo Final, mesmo que o Congresso Nacional aprove uma lei específica para isso.

O conceito para a anistia dos delitos de corrupção acaba de ser consagrado, mais uma vez e agora de forma indiscutível, pela decisão do ministro Dias Toffoli de anular todos os processos contra o empresário Marcelo Odebrecht, o condenado-estrela da Operação Lava Jato. Ele confessou, com a plena assistência e orientação dos seus advogados, o pagamento de suborno em massa para gatos gordos da era Lula-Dilma. Os atos de corrupção então praticados foram descritos como os maiores de toda a história.

Odebrecht delatou parceiros de crime. Devolveu parte do dinheiro furtado. Comprovou-se, até mesmo, que a sua empresa tinha um departamento inteiro encarregado de selecionar, arquivar e executar o pagamento de propinas, com codinomes para os políticos e magnatas comprados. Mais do se provou nesse caso, em matéria de corrupção, é impossível provar. Mas, por ordem de Toffoli, todas as provas, processos e acusações foram anulados. Está quase proibido, hoje, citar o seu nome em qualquer frase que contenha a palavra “corrupção”.

O mesmo Toffoli já tinha perdoado recentemente o pagamento de multas que a Odebrecht e outra empresa envolvida em alta corrupção, a J&F, tinham se comprometido a pagar em acordos de leniência. Na ocasião, foi citado nove vezes num relatório da Transparência Internacional sobre corrupção no Brasil. A assinatura nos atos de proteção à ladroagem geral da era Lula-Dilma é de Toffoli. Mas a fatura moral vai para a biografia de todos os ministros do STF. O pior de tudo, na verdade, nem é a anistia para a corrupção. É a desculpa que deram – a de que o “devido processo legal” não foi seguido no caso de Marcelo Odebrecht.

Para um tribunal que já baseou decisões oficiais em material obtido criminosamente por hackers, manteve um morador de rua preso durante onze meses por “golpe de Estado” e deixou morrer na cadeia um acusado com necessidade urgente e comprovada de ser levado ao hospital para tratamento médico de urgência, é a superação de um novo limite.

J. R. GUZZO é jornalista.