10 de setembro de 2024
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J.R. GUZZO
A história oficial do Brasil de hoje, narrada, revisada e aprovada pelo STF, registra que, no final do mês de agosto de 2024, a plataforma X foi expulsa do país por desobedecer a ordens judiciais. Também se recusava a cumprir as leis que obrigam todas as empresas estrangeiras a manter um presidente no Brasil, segundo consta em sua bula de excomunhão. Mais que tudo, sempre segundo a versão ora em vigor, era uma operação tóxica que se valia da liberdade de expressão para espalhar notícias falsas, calúnias, desinformação, discurso do ódio e ataques às instituições.
A história contada com apoio nos fatos registra os mesmos eventos sob um outro prisma. No final de agosto de 2024, por decisão individual de um ministro do STF, 20 milhões de cidadãos brasileiros foram proibidos de escrever e de ler mensagens no X. Não eram parte da demanda judicial que envolvia a plataforma. Não tinham usado a rede para espalhar nenhuma notícia falsa, calúnia, desinformação etc. etc. etc. Não estavam indiciados em nenhum inquérito – e não foi por falta de inquérito, pois o ministro Alexandre de Moraes tem pelo menos uns dez em andamento, com todos os acusados que quis incluir.
Nenhum dos indiciados pelo ministro pode publicar uma única sílaba no X, ou em qualquer rede social da qual seus perfis estão banidos. Aliás, se alguém divulgar qualquer notícia falsa etc. etc. etc., em qualquer lugar, vai ser bloqueado também. O empresário Elon Musk, dono do X, vai continuar usando a rede para falar o que quiser a seus outros 500 milhões de usuários. Feitas todas as contas, o que realmente se tem de prático é que 20 milhões de brasileiros não podem mais dizer ou ouvir nada na maior rede social que havia no País.
A história do STF, sustentada pelos fiéis de sua religião, diz que as redes sociais, a começar pelo X, são um instrumento da extrema direita para destruir a democracia no Brasil. A história segundo os fatos diz que crimes cometidos através da liberdade de expressão, da calúnia à injúria, do racismo à pregação da derrubada do Estado de Direito, são punidos pelas leis em vigor no país. Quem não faz nada disso perdeu o direito de usar o X por atos cometidos por outros – os descritos acima e todos os que o ministro considera “antidemocráticos” e inclui nos seus inquéritos.
Os brasileiros que o Supremo acusa de transgressão têm seus perfis derrubados, sofrem bloqueio de contas bancárias, são alvo de pedidos de extradição à Interpol e de mais tudo o que o STF, PF, MP etc. podem jogar em cima deles. Já estão punidos e silenciados; não são eles o problema. O problema era os outros 20 milhões. Pelo visto, não é mais.
J. R. GUZZO é jornalista.