“Quem toca não dança ao mesmo tempo.” Penso que este provérbio argentino pode ser interpretado de várias maneiras. A primeira: se devo fazer alguma coisa, devo fazê-la bem, como se fosse a única coisa que tenho a fazer. Nada me pode atrapalhar ou distrair. A segunda: ou sou bom em tocar ou sou bom em dançar. A terceira: não posso fazer tudo sozinho. Preciso sempre de ajuda. Para dançar, preciso de alguém que toque a música. Se toco a música para dançar, preciso de alguém que dance, para dar sentido ao meu trabalho de músico. Talvez o provérbio queira me ensinar a fazer bem uma coisa de cada vez e aceitar que os outros me ajudem e assim, pelo trabalho dos dois, teremos a música e a dança. – Frei Clarêncio Neotti, OFM – folhinha do dia 14 de fevereiro de 2023 – do calendário “Sagrado Coração de Jesus”, da Editora Vozes Ltda (cneotti@yahoo.com.br)
O provérbio, realmente, pode ser interpretado de várias maneiras e o frei citou três formas de entendê-lo. Nem sempre se consegue fazer mais de uma tarefa ao mesmo tempo. Mesmo quando dá para fazer duas ou três, dependendo da facilidade ou dificuldade de cada uma, acreditamos que é preciso muita habilidade para conseguir que elas saiam a contento. Portanto, a primeira maneira é: fazer um trabalho de cada vez, com muita atenção e profissionalismo, será o ideal. Assim, a certeza de que a tarefa será muita bem executada, chegará a cem por cento ou quase. Afinal, perfeição em tudo, é obra de grandes artistas ou grandes profissionais, mas nunca custa tentar. É só dar toda a atenção e empenho. É dedicar-se única e exclusivamente ao trabalho como se ele fosse, mesmo, a única preocupação do momento. Nada, como diz o frei, pode distrair ou desviar a atenção do executante, precisa estar concentrado.
Na segunda maneira de interpretar, o frei questiona: sou bom em tocar ou sou bom em dançar? Eu já vi muitos executantes musicais tocando o seu instrumento e chacoalhando o corpo, como se estivesse dançando, acompanhando o ritmo da música. Todavia, se ele quiser dançar a música como ela deve ser dançada, dificilmente ele conseguiria fazer as duas atividades ao mesmo tempo. Até o pianista, que executa seu instrumento sentado, usa a expressão corporal acompanhando a música que ele está tocando. Seria uma forma de dança ou apenas, mesmo, expressão corporal no envolvimento com a música? É preciso, então, ser bom numa ou noutra atividade. O músico poderá até ser bom em ambas, mas terá de executar o instrumento ou a dança, as duas atividades ao mesmo tempo será muito difícil. Como existem artistas de várias categorias e classes, parece que, para alguns, até seja possível. Só observando as várias apresentações artísticas para uma melhor avaliação.
A terceira maneira de interpretar o provérbio, quando o frei diz que não podemos fazer tudo sozinhos, sempre precisamos de alguém para ajudar, nós entramos na velha e surrada orientação em termos de trabalho ou administração: o trabalho em grupo é importante e rende mais. A atividade laboral industrial vem sendo estudada por especialistas há alguns séculos. Do trabalho puramente braçal nas indústrias antigas, as técnicas foram se aperfeiçoando até chegar nas condições de produção em série e hoje, com a ajuda da cibernética os avanços não param de ocorrer. Hoje, se fala muito em trabalho em grupo, ou seja, a união faz a força.
Vários especialistas ficaram famosos com seus estudos e ideias para modernizar cada vez mais as técnicas de produção. Com o trabalho braçal, ocorreu o mesmo, as técnicas foram surgindo e inclusive os instrumentos e ferramentas para facilitar cada vez mais o trabalho. Fazer um trabalho só de cada vez é o ideal, pois assim a chance de sair bem feito é bem maior.
Em estudos de organização racional do trabalho há um ensinamento muito interessante que diz: não existe uma maneira perfeita de se fazer um trabalho. Cada vez que se aperfeiçoa um sistema ou método de execução, logo à frente, surgirá uma nova maneira melhor ainda. É questão de tempo. Pratiquei isso quando fui bancário e depois, quando trabalhei como contabilista, tanto na época de empregado como quando exerci a profissão por minha própria conta. Rui Barbosa dizia: “No desenvolvimento do gênero humano, cada progresso realizado é o princípio de um progresso maior.” A história do progresso humano prova isso.
LUIZ GUILHERME WINTHER DE CASTRO, professor de oratória e de técnica vocal para fala e canto em Carmo do Rio Claro/MG, ex-professor do ensino comercial com reg. no MEC, formado no curso normal superior pela Unipac. E-mail: luizguilhermewintherdecastro@hotmail.com