Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho
Houve um tempo em que o céu parecia mais azul, e o vento trazia perfumes de esperança. O amanhã se desenhava como um horizonte promissor, pintado com as cores vivas da confiança e do sonho. Hoje, porém, o mundo veste tons pálidos e secos, refletindo a alma exausta de uma humanidade que se esqueceu de si mesma. A paz, antes um hino suave entoado pelos corações, tornou-se um lamento abafado entre gritos de ódio e sussurros ácidos de medo.
Onde foi parar a inocência? Aquela centelha no olhar das crianças, capaz de iluminar até os cantos mais escuros da existência? Parece ter sido engolida pela ganância, substituída pelo brilho artificial de telas que nos aprisionam em realidades vazias, enquanto a vida ao redor fenece silenciosamente. A compaixão — outrora o pulsar mais nobre das relações humanas — tornou-se palavra oca, um som perdido em deserto de egoísmo.
O homem transformou-se em fera. Mas não na fera altiva da floresta, que luta pela sobrevivência em harmonia com a natureza. Tornou-se predador de si mesmo, devorando a própria alma até que restassem apenas sombras. Bondade e generosidade deixaram de ser virtudes e passaram a ser confundidas com fraquezas. A misericórdia, antiga amiga dos que ainda conhecem o valor de um abraço, sumiu sem deixar vestígios.
A falta de amor é uma ferida invisível, mas sangra. Sangra em cada gesto frio, em cada olhar desviado, em cada palavra cortante. A ganância tomou o lugar do simples desejo de viver com dignidade. Na corrida frenética por mais — mais dinheiro, mais poder, mais controle —, perdemos aquilo que nos fazia verdadeiramente humanos: a alma.
Se alguém souber onde reencontrá-la, que anuncie! Que clame aos céus, convoque o sol, invoque a lua e as estrelas para ajudar na busca. Sem essa essência, sem a esperança que dela brota, os dias tornam-se um cortejo de sombras, e as noites, abismos de desespero.
A pior das guerras não é a que explode nas manchetes. É a silenciosa, travada dentro das pessoas. Nesse campo invisível, o amor resiste ao cinismo, a fé se levanta trêmula sob o peso da descrença, e a esperança luta para não sucumbir à dureza do real.
Que o céu nos acuda! Pois a humanidade, tal como sua essência, perdeu-se de si mesma. Mas ainda pulsa, no fundo do coração do mundo, um anseio silencioso: o desejo de que um novo homem se levante — alguém que traga nos olhos a luz da bondade e no coração a força da paz. Que ele venha. E que, em sua presença, reencontremos a beleza, a dignidade e a coragem de sermos, enfim, humanos.
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.com).