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Oppenheimer: denso e difícil, mas eficiente

10 de agosto de 2023

Cillian Murphy e Robert Downey Jr. em cena de 'Oppenheimer'./ Foto: Divulgação.

CINEMA

Quando falamos de Christopher Nolan, logo vêm à mente a complexidade na trama de seus filmes. Apesar de sua suposta arrogância, o cineasta gosta de se desafiar trabalhando em ideias que, por mais complicadas que pareçam (vide o roteiro de “Amnésia”), acabam entretendo multidões e as fazendo deleitar-se em sua própria confusão. Já “Oppenheimer” (em cartaz no Cine Roxy, em Passos) é o oposto, baseando-se em uma simplicidade narrativa incomum para seus padrões.

É justamente essa facilidade que pede a história de J. Robert Oppenheimer, vivido por Cillian Murphy em uma performance assombrosa. O físico, uma das figuras mais polêmicas e contraditórias do século XX, foi de um jovem com carreira promissora no campo da física quântica a “pai da bomba atômica”.

Motivado por uma mistura de vaidade e medo de ver seu campo de estudos subvertido e transformado em arma pelos nazistas, ele se torna o diretor do programa norte-americano para o desenvolvimento das bombas nucleares. No meio do caminho, entretanto, a Alemanha se rende, deixando como derradeiro alvo do projeto o Japão, único país do Eixo que ainda resistia.

Só que “Oppenheimer” não é um drama histórico e nem mesmo um filme sobre as bombas atômicas em si, mas um estudo de personagem. Isso pode pegar de surpresa os fãs mais árduos do diretor, acostumados com sequências de ação bem executadas e com histórias complexas. Dessa vez, Nolan abre mão de tudo isso em favor de extensas cenas de diálogos que exploram da moralidade questionável de Oppenheimer em sua vida pessoal às implicações políticas do desenvolvimento das bombas.

Esse experimento é bem-sucedido em diversas frentes, a mais óbvia sendo a atuação de Cillian Murphy. Parceiro de longa data de Nolan, ele finalmente tem a chance de brilhar como protagonista após anos como coadjuvante. Seu Oppenheimer é uma mente perturbada desde os anos de faculdade, algo que o ator consegue transmitir com meros olhares.

O trabalho de maquiagem sutil certamente ajuda, mas a forma com que o personagem muda de porte e expressão é notória apenas pela performance de Murphy. Ele é acompanhado por um elenco coadjuvante igualmente poderoso, da explosiva Emily Blunt no papel de sua esposa, Kitty, a Robert Downey Jr. como seu colega no governo, Lewis Strauss.

Apesar de abdicar da ação, “Oppenheimer” impressiona também pela primazia técnica, principalmente em relação à edição e mixagem de som. Do teste do Projeto Trinity às visões do protagonista acerca de seus atos, é por meio do som que Nolan cria uma sensação de completa imersão quando trata da bomba em si.

“Oppenheimer” claramente não foi feito com a intenção de ser um blockbuster. Pelo contrário, trata-se de um tipo de filme que quase não se vê mais lançado em circuito comercial: longo, denso e difícil de engolir, sem a menor preocupação em entreter, mas que aborda questões sérias de forma madura e objetiva. O resultado é um desafio de Christopher Nolan a si mesmo e a seu público, mas um estudo irretocável sobre nosso poder autodestrutivo.

OPPENHEIMER (Oppenheimer). EUA, 2023. Gênero: Biografia. Direção: Christopher Nolan. Elenco: Cillian Murphy, Emily Blunt, Matt Damon, Robert Downey Jr., Florence Pugh, Jason Clarke, Gary Oldman, Rami Malek, Kenneth Branagh, Casey Affleck, Alden Ehrenreich, Josh Hartnett, Matthew Modine. Cine Roxy, em Passos, 20h30 (Leg).