Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho
As crônicas do Velho Braga
Costuma-se dizer que obras de vulto e relevância passam por Minas. Às vezes escapam aos olhos e sentidos. Não se atirando a bairrismo e nem a exagero retórico, isso tem sua verdade. Só botar reparo. Um pouco de atenção dá norte e concepção quanto ao referencial do que ocorre na fertilidade das alterosas.
Apaixonado por crônicas bem feitas e bem elaboradas, sou entusiasta do escritor Rubem Braga. O “Velho Braga”, como o próprio se intitulara – embora capixaba, nasceu em Cachoeiro do Itapemirim – passou por BH, em Minas fez Direito, não foi adiante, deixou de lado as teorias jurídicas para se agigantar na literatura. Ao depois, correu o mundo.
E olhe que estamos falando do maior cronista brasileiro, opinião geral entre seus pares. Sem sombra de dúvida, Rubem Braga carrega consigo um primoroso estilo de crônica com surpreendente poder de síntese. Escreve o essencial em poucas palavras.
Um gigante em discorrer aspectos do cotidiano. Em vida escreveu sobre tudo que viesse à cabeça: cinema, literatura, vida e seus percalços. Escreveu muito por atraentes e louváveis caminhos das maravilhas, não deixando de lado as críticas sociopolíticas.
Sua obra lhe fez valer o título de o maior cronista do século XX. Produziu pérolas no ramo de se ler uma boa crônica com sabor inigualável do que há de melhor no gênero. Modesta opinião: o gostinho festivo da felicidade no ato de ler. Boa leitura tem sabor? Pois claro que sim.
Braga não foi só escritor de grandeza invulgar ao longo da vida, 62 anos de carreira no jornalismo, tendo escrito cerca de 15 mil crônicas. Também correspondente de guerra, embaixador, trabalhou na Globo. Antes fora editor – sócio em duas editoras com Fernando Sabino. Emprestou seu talento em diferentes matizes e segmentos nas esferas do saber e a tudo se dedicou com excelsa qualidade.
Antigamente, quando havia passarinhos no quintais da esperança, e gatinhos brancos e pretos achados e colhidos de árvores por gente do bem – quiçá provindos do céu – também havia nos jornais e revistas seções de crônica, deliciosas crônicas. Depois houve mudanças editoriais, deu-se lugar a reportagens. Na desesperança, o lírio e o lírico se perdeu para o vermelho escarlate.
Seu Velho Braga passou por Minas e deixou marcas profundas. Depois mudou-se para o Rio. Exatamente naquele paradisíaco lugar, Seu Braga ficou solenemente famoso por escrever a crônica eloquente de sua carreira: Ai de Ti, Copacabana! No que completo, para salvaguarda da boa literatura, ai de nós se não aparecessem outros Bragas para nos socorrer e nos livrar de prosas ruins e azedas, nos mais variados estilos.
Felizmente há bons escritores por aí, bem perto de nós. Não com o talento do autor de “FEB na Itália”, obra que seguramente guindou Rubem Braga para o sucesso literário. Com a morte do Velho Braga, em 1990, aos 78 anos, ficamos a ver navios no deserto da pobreza do ardor clássico.
Continuo dizendo, há bons escritores e cronistas a serem apreciados. Nos jornais, em especial. É preciso o incentivo. Que o povo volte a ler para dar notícia, tome conhecimento que de fato existem e a gente possa saber o que escrevem.
Como é bom ler e tomar da alma do autor, de graça e com graça de poder. E compartilhar. É gesto de amor. O próprio Freud dizia que “as palavras e a magia foram no princípio a mesma coisa”.
Por fim, pérola extraída da alma de Rubem Braga: “Eu considerei que este é o luxo do grande artista, atingir o máximo de matizes com o mínimo de elementos. De água e luz faz seu esplendor, seu grande mistério é a simplicidade”.
PS: Para Mauricio Ponsancini Artes, pelas bênçãos de São Francisco.
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.com)