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Opinião

LUIZ GONZAGA FENELON NEGRINHO

Viver com a serenidade da alma

Desde muito cedo aprendi que o ditado existe para ser utilizado com cautela e distribuído entre as pessoas a fim de que, com isso, com as recópias, possamos tirar proveito e fazer o certo, sem a necessidade de continuar errando.

Em sendo assim, vamos aprendendo com os erros e desacertos, já que raras vezes mudamos nossa rota para a feitura do correto. Sintetizando, se aprendêssemos e praticássemos nas primeiras lições, evitaríamos as máximas, aforismos, os princípios básicos, enfim.

A definição pode ser boa, o conceito melhor ainda, mas não é assim que acontece. Sabemos dos riscos e perigos. No entanto, sem maiores cuidados, trilhamos os caminhos da desatenção, as veredas dos erros, especialmente aqueles que devemos nos abster. “Errare humanum est”. Aí, nesse particular aparece o ato misericordioso desse provérbio latino, o de que “errar é humano”.

Quando criança – entre jogos e divertimentos –, aprendi muito com as atividades lúdicas. Mais ou menos assim. Ao tempo que sentia prazer nas diversões, sem que quisesse, nada de alvará e licença, simplesmente na simplicidade e pureza de brincar, adentrava os caminhos do aprendizado.

E aprendia muito, ainda que, confessando, não deixo de cometer meus pecados até os dias de hoje. E nisso vou “vivendo, amando e aprendendo”. O escritor ítalo-americano Leo Buscaglia (1924-1998), num livro maravilhoso que pouco importa o rótulo que a ele deem, se auto-ajuda ou não, nos mostra em síntese uma maneira de melhorar o relacionamento com a vida, com tudo e todos que nos cercam.

É dele essa preciosidade literária: “O amor perfeito é realmente raro, pois para ser amante é necessário que você tenha continuamente a sutileza de um sábio, a flexibilidade de uma criança, a sensibilidade de um artista, a compreensão de um filósofo, a aceitação de um santo, a tolerância de um estudioso e a força de um bravo”.

Foi então que, sem querer, voltei aos tempos da brilhantina. E comecei uma brincadeira. Começar uma brincadeira também pode ter o seu preço – às vezes alto.
Pelas bandas musicais pelas quais passei quando jovem, gostava de cantar alguns “hits”.

Fim da década de sessenta e início de setenta, época maravilhosa, especialmente quando cantava um dos maiores sucessos dos irmãos Barry, Robin e Maurice Gibb: “I Started a Joke” (Eu comecei uma brincadeira). E por toda a vida jamais pensei que a brincadeira pudesse se voltar contra mim. É como diz parte da letra da canção que fez sucesso mundo afora.

Bem da verdade, a letra nada tem de especial a não ser o fato do que disse sobre a brincadeira se voltar contra quem a começa ou começou. Quando rimos aleatoriamente por algo que não nos diz respeito, a precaução deve ser envidada nos limites da prudência. O caldo de galinha entra e corre ao largo, mormente nesses dias frios e gelados.

A brincadeira pode ser um sinal de tomada de posição ou retomada de inesperadas trincheiras. Talvez uma súplica brotada de algum lugar que nos leve a olhar para o alto; contemplá-lo na extensão de sua beleza, sem perder a razão de que os sorrisos e risadas, armados no rosto, ainda que cenários não propícios e encantadores venham ceder lugar a lágrimas que facilmente possibilitem dançar no reverso da face.

Mas, não. Perder a esperança, jamais! Dos irmãos nascidos na Ilha de Man, nas dependências da Coroa Britânica e viveram na Austrália, resta apenas um para contar a história do grupo musical que vendeu mais de 220 milhões de discos em todo o mundo: Barry Gibb.

Que Barry não se abata e no sempre possível volva os olhos para o céu e o contemple na extensão de sua riqueza. Certeza plena se acercará da sabedoria de São Francisco de Assis, ao entoar o melhor dos cânticos, como o gorjeio dos pássaros que buscam a água da fonte viva, os cereais do campo, e, depois, voam alegres, festivos e cantantes para os píncaros da glória, rendendo graças ao Criador.

Em doces lembranças de um tempo que jamais há de apagar, Barry Gibb deve continuar cantando belíssimas canções como “Don’t Forget To Remember”, “Massachusetts”, “Words”, “How Can You Mend A Broken Heart”, entre tantas outras, como se seus irmãos estivessem ao lado. E se der vontade de chorar, que chore a perda dos entes queridos, hoje mais do que nunca presentes nos palcos da saudade. Faz bem, limpa a alma e aplaca as placas impiedosas e tristes, quando não amargas do coração.

A voz mais linda de que se tem notícia não é aquela emitida pelo aparelho fonador. É a voz da consciência e da alma. Há pessoas que cantam com a alma. Meu filho Sérgio (SELF) canta com a alma. No Alto da Penha, Aguimar e Roni (no ‘Coliseu Pub’) cantam com a alma. Por isso, hoje eu me lembrei de “I Started A Joke”.

No agir humano, em sua falibilidade, não sabia de jeito algum que a “brincadeira poderia se voltar contra mim”. Mas sobrevivi e estou vivo, pelas graças de Deus. “Vivendo, amando e aprendendo”. Com a mente aberta para continuar vivendo, amando e aprendendo.

A propósito, para quem acha que tudo na vida dos Bee Gees foi sucesso, fama, riqueza, paz e serenidade, ora, pois, disso tome conhecimento. O filho mais velho de Barry – Stephen Gibb – chafurdou-se no mundo do álcool e das drogas, fez-se morador de rua e comer de lixeiras num breve período da vida. Para ele, só três possibilidades: morte, prisão ou instituição psiquiátrica. Optou pela vida. E o próprio Maurice Gibb, do trio mais famoso do mundo, também sofreu com tormento da dependência com álcool e drogas.

E para viver bem, sem nenhuma perturbação de ordem, ainda que na desordem, e nenhum trauma – como diz o próprio autor Leo Buscaglia: “doar, aceitar, não se intimidar por limites e adversidades, confiar, bem-viver e amar – sobretudo amar”. Em síntese: “Tiremos o mais alegre proveito da vida”.

É difícil, complicado, arranca pedaço, exige supremacia de atos? Absolutamente, não. Então que se ame e se deixe amar. E estamos certos, como dois mais dois são quatro.

PS: Para Evania Rosa, da 51ª Subseção da OAB de Passos, tutoria e suporte na prática do bem.

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.com)

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