Opinião

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17 de maio de 2023

WASHINGTON L. TOMÉ DE SOUSA

Ainda as ‘fake news’ e as supremacias

Elvis não morreu…

O holocausto de judeus nos campos de extermínio nazistas não ocorreu…

A terra é plana, não é redonda…

O corpo de Ulisses Guimarães não foi achado porque foi abduzido…

Pérolas do absurdo que circulam pela internet e que têm seus seguidores e defensores, isso sem se falar nos temas políticos e religiosos amplamente divulgados nas redes sociais, que, de igual modo, têm seus adeptos e divulgadores, por mais estapafúrdios que sejam – e quanto mais ilógica, incoerente, mentirosa e irracional for a proposição, mais seguidores vai arrebanhar -, gerando polêmicas infindáveis, ameaças e agressões verbais, que antes promovem o ódio e o desentendimento, no lugar do diálogo e da construção de um mundo melhor.

Quando o jornalista Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta), falecido em 1968, nos primeiros anos do Regime Militar no Brasil, lançou o livro Febeapa, (Festival de Besteira que Assola o País, 1966), criticando e debochando de militares, políticos, autoridades diversas e suas decisões incoerentes e, muitas vezes, hilárias – só mesmo no Brasil, em plena ‘ditadura’, surreal! -, ele o fez com seu fino humor sarcástico, de cuja narrativa selecionei, abaixo, algumas pérolas (se fosse hoje, com certeza estaria amargando cadeia, tornozeleira, processos mil etc., por ‘ameaçar’ a democracia e as instituições).

“Foi então que estreou no Teatro Municipal de São Paulo a peça clássica ‘Electra’, tendo comparecido ao local alguns agentes do DOPS para prender Sófocles, autor da peça e acusado de subversão, porém já falecido em 406 A.C.”.

“A minissaia era lançada no Rio e execrada em Belo Horizonte, onde o Delegado de Costumes (inclusive costumes femininos), declarava aos jornais que prenderia o costureiro francês Pierre Cardin (bicharoca parisiense responsável pelo referido lançamento), caso aparecesse na capital mineira ‘para dar espetáculos obscenos, com seus vestidos decotados e saias curtas’.

(…) Toda essa cocorocada iria influenciar um deputado estadual de lá, Lourival Pereira da Silva – que fez um discurso na Câmara sobre o tema ‘Ninguém Levantará a saia da Mulher Mineira’. Aqui cabe uma ressalva, pois “a mineira só dá pra mineiro”, segundo antiga propaganda da Loteria Mineira, da década de 1970 (os mais velhos vão se lembrar!), alterada, posteriormente, para “a mineira só sai pra mineiro”, pois a original, maldosamente ou não, atentava contra os bons costumes das famílias deste estado tão casto.

De Ibrahim Sued, famoso colunista social, já falecido, ao lembrar que este iniciava seu programa de televisão anunciando: “Estarei aqui diariamente às terças e quintas”, como exemplo dos absurdos que o país vivia em todos os setores – e citando casos como o do prefeito de Petrópolis, cidade serrana do Rio de Janeiro, que baixara normas para banhos de mar”.

Tudo isso chega a ser até ‘romântico’, diante da total falta de coerência e razoabilidade de grande parte das ideias propostas e das discussões que se travam hoje nas redes sociais, onde imperam, cada vez mais, as ‘Fake News’ e um festival de besteiras sem fim. A inteligência, a lógica, a educação e respeito às opiniões divergentes, o diálogo, estão sendo postos de lado, e tem-se dado vazão, cada vez mais, ao passionalismo, que leva aos radicalismos de todos os matizes.

Precisamos nos posicionar acima dessas paixões deletérias, com firmeza e serenidade, para construirmos, com a razão, uma sociedade melhor para nós e para as gerações futuras. Resta, no entanto, a opção de nos incorporarmos ao universo das ‘bestas’, e continuar produzindo besteiras, e, infelizmente, é o que muitos continuarão a fazer.

P.S.: Ao encerrar estas linhas, sou desafiado pela leitura de ‘Ortodoxia’, de Chesterton, em que ele propõe, grosso modo, que o universo das pessoas que defendem a supremacia da lógica, da razão, do determinismo (e, também, do predeterminismo), das certezas absolutas (perdoem-me a redundância), em contraposição ou desconsideração ao dos sonhadores, dos poetas (quando fala o ‘coração’), é o universo dos manicômios.

O que, de certa forma, coloca em xeque, também, os modernos cursos de autoajuda. Não posso deixar de transcrever, a seguir, este pequeno trecho do livro, para ilustrar a afirmação: “Pessoas… confiam completamente em alguns axiomas cínicos que não são verdadeiros… Lembro-me de, certa vez, andar com um próspero editor, que fez uma observação a qual eu já ouvira antes; ela é, de fato, quase um lema do mundo moderno… O editor disse a respeito de alguém: “Esse homem vai conseguir, ele acredita em si mesmo”. Eu respondi a ele: “Posso dizer-lhe onde estão os homens que mais acreditam em si mesmos? Pois vou dizer.

Sei de homens que acreditam em si mesmos mais colossalmente do que Napoleão ou César. Sei onde arde a estrela fixa da certeza e do sucesso. Posso guiar você ao trono dos Super-homens. Os homens que acreditam em si mesmos estão todos em manicômios”.

Fujamos das ‘Supremas Certezas’. Supremo, só há um.
Saúde e paz a todos!

WASHINGTON L. TOMÉ DE SOUSA, bacharel em Direito, ex-diretor da Justiça do Trabalho em Passos, escreve quinzenalmente às quartas, nesta coluna