Mudanças de mentalidade para transformar o ensino médio
O ano de 2023 foi intenso quando o assunto foi ensino médio. As mudanças repentinas exigidas pela medida provisória assinada pelo então presidente Michel Temer em 2017, que passaram a ser de fato aplicadas a partir de 2022, criaram um vale de incertezas e aquela sensação de “trocar o pneu com o carro em movimento”. Um desafio imposto até mesmo às escolas que já estavam em processo de mudanças.
Uma das mudanças mais significativas – e que deve perdurar – é a inclusão do ensino técnico dentro da formação básica. E nesse ponto, ainda que exista todo o estica e puxa de horas do conteúdo básico, se o ideal são 2.100 ou 2.400 horas para linguagens, matemática, ciências da natureza e humanas, aprender a lidar com o mundo do trabalho cada vez mais cedo é urgente, uma demanda não exclusiva do Brasil, mas do mundo inteiro, e que deve ser uma pauta apreciada com bastante cuidado pela sociedade, especialistas e autoridades.
Se um dos propósitos da educação é preparar para o trabalho, esse é o grande diferencial da educação técnica nessa fase da vida: vivenciar experiências do cotidiano profissional em um espaço seguro para aprender as dinâmicas corporativas, independentemente de ter em mente uma ocupação específica, além de trazer um senso de propósito às juventudes que o modelo tradicional se limitava à preparação aos vestibulares e, mais recentemente, ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Ficou no passado a imagem preconceituosa do profissional de nível técnico como um trabalhador menos qualificado e com chances reduzidas de crescimento. Essa chave, na prática, virou e há muitos anos. A amplitude de cursos e eixos formativos para essa modalidade agora é enorme, assim como a procura por pessoal qualificado para vagas que, inclusive, chegam a pagar bem acima da média nacional. Hoje o técnico é designer, apresentador de TV, fotógrafo, programador de software, entre outros.
Essa nova realidade foi demonstrada em dados. O Insper, com os institutos Itaú e Unibanco, comprovou, por meio de pesquisa, que a remuneração de um estudante de ensino médio técnico pode chegar a ser 32% mais alta ante aqueles que concluíram no modelo regular, além de resultar em maiores chances de conseguir um emprego formal no final do curso. Apenas esses indicativos já seriam suficientes para nortear novos pensamentos em termos de políticas públicas, investimentos e parcerias para que mais jovens tenham condições de acesso a essa modalidade em uma etapa tão decisiva da vida.
Outra questão muito relevante é a do propósito do curso, que aqui pode estar intimamente relacionada à evasão escolar. A partir do momento em que esses três últimos anos da educação básica se tornam um momento de preparação para a vida adulta de forma geral, e não somente para grandes provas, há muito mais em jogo e mais motivação para seguir em frente.
Um estudo publicado pela Universidade Stanford (EUA) traduziu em números as ainda altas taxas de abandono escolar, em particular no nível técnico. No caso dos cursos desvinculados ao ensino médio, o índice de conclusão é pouco maior que 20%. Nos ofertados de forma simultânea, mas não articulados ao nível médio, os índices gerais de conclusão são melhores, mas mais baixos que o médio regular, 63,3% frente aos quase 70% em retenção de alunos. Especificamente no Instituto Federal de São Paulo, onde o índice de evasão geral nos cursos técnicos é de 43%, no técnico articulado ao ensino médio a taxa de desistência é de apenas 6,9%.
Analisando os dados e cenários apresentados podemos compreender o quanto será benéfico para os jovens estudantes um modelo de ensino que os capacite para os desafios da vida e para o trabalho. Dessa maneira, que esteja alinhado ao que o estudante realmente deseja ser ou gostaria de explorar futuramente de forma empreendedora e, sobretudo, emancipada. Que o aprendizado seja proveitoso, com sentido para cada pessoa, naquele momento e num futuro cada vez mais imediatista. A mudança de mentalidade é urgente e precisa estar voltada ao que se deseja do País para as próximas gerações.