26 de dezembro de 2023
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho
No turbilhão de vidas que circulam na cidade que anda há corações solitários em triste solidão. São corações com cara de dia cinzento por desilusão do amor incompreendido. Amores que mais parecem estrelas tênues e apagadas no firmamento. Não acreditam em possibilidades, a escuridão frívola de que são atacados os impede de ver uma reviravolta no que se refere a fôlego de vida. Em hebraico “shamah chay”, o sentir-se vivo e ativo. No conceitual, a capacidade de repassar a esse mundão a notícia de que se está vivo.
Não deve existir nada, absolutamente nada, que remeta à entrega dos pontos, o dar-se por vencido, o sentir-se só, como que a desejar a sorte do mamulengo, o que lembra mão mole, a moleza por si só.
Com efeito, nesta cruenta selva de pedra muitas maldades a nos circundar. Não há lugar para fragilidade e vulnerabilidade gratuitas. Não que por isso não devamos praticar o jogo da amabilidade e ternura. Há deveras como conciliar o mal com o bem a partir do próprio homem. Até mesmo no aconchego da solitude e do retiro. Por que não? Fazer-se bloco de gelo, não ceder espaço à flexibilidade em face de aterradoras situações, não é forma inteligente e adequada. O ideal para desligar-se do marasmo da angústia de se estar só, ou o sentir-se só, é não nos entregarmos ao desmazelo de uma vida qualquer. O ruim deve ficar para trás, sem direito a volta. Tanto se fala em oportunidades perdidas.
Fotografias e vídeos ultrapassados que se perderam no tempo. Jazem inertes no fundo de gavetas e no cemitério das lembranças. Os sonhos que insistem não ficar distantes, ainda que em imagens irreais, podem até incomodar. E odiosamente incomodam. Quando o gatilho “não” deve ser acionado para se opor à sensação do desagradável.
O fluxo há de continuamente bater às portas para nos alertar. Ainda que no tormento da vileza do cotidiano, a vida continua, mesmo que o fracasso da sorte venha beliscar e machucar o sentimento da impotência de que não raro somos atacados. Aí, então, se não nos fizermos fortes e darmos um basta, ah, nem Freud em indefinidas análises de postura e comportamento há de ajudar a conter o muro que nos separa da possível sorte da reconciliação da vida que precisa ser vivida. Sim, ainda que arduamente vivida e à custa de um certo suplício.
Na lembrança, em sede e rede de “representações inconscientes e de afetos”, Jean-Paul Sartre, aponta: “O segredo de um homem não é seu complexo de Édipo, e sim o próprio limite de sua liberdade, seu poder de resistência aos suplícios e à morte”.
É bom e salutar que se aprenda a viver consigo mesmo. Trabalhar os traumas e hostilidades do passado é preciso. No entanto, para se obter a paz em comunhão, para a beleza da união da partilha, é preciso relacionar-se bem com as pessoas e com o mundo. Ainda que beire a desenfreada chatice, esta é a fórmula, senão mágica, pelo menos vital para que se consiga dizer: – “Ei, estou vivo, comigo ninguém tasca!”.
Parafraseando mensagem a mim enviada dias atrás, algo assim: “Por que não vestir-se de felicidade?” No jogo ativo das emoções, a dopamina – o hormônio do bem-estar agradece.
PS: O livro “Tempo do Tempo”, de Sebastião Wenceslau Borges, foi lançado terça última (19) na Casa da Cultura de Passos. Caso queiram, um ótimo presente de Natal. Teteia produzida por alguém que ama uma cidade de tantos causos. O registro e a dica.
PS2: Feliz Natal a todos é o que deseja um fanático herdeiro do romantismo à moda antiga.
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (Luizgfnegrinho@gmail.com)