MARCEL VAN HATTEM
Criminosos à vontade nas sedes do poder em Brasília
A recepção da “Dama do Tráfico” no Ministério da Justiça brasileiro pode ter sido a pá de cal nas pretensões do ministro Flávio Dino de ser indicado por Lula para a segunda vaga aberta para o STF. Eu ainda duvido, pois esse governo consegue se superar na infâmia todos os dias. O fato é que, se for apenas esta a consequência, ainda é muito, mas muito pouco.
Senão, vejamos: o governo brasileiro, no seu mais importante prédio no que diz respeito à defesa da lei e da ordem, o Palácio da Justiça na Esplanada dos Ministérios, recebeu Luciane Barbosa Farias, conhecida como Dama do Tráfico e condenada em segunda instância a dez anos de reclusão, para discussões sobre supostas torturas no sistema carcerário brasileiro.
Pior: tudo sem o devido registro nas agendas dos agentes públicos que a receberam, em claro descumprimento das regras da Lei 12.813, de Conflitos de Interesse. E quem é um dos presos que Luciane defende? Seu próprio marido, Clemilson dos Santos Farias o Tio Patinhas, condenado a 31 anos de cadeia, líder do Comando Vermelho no Amazonas, e cuja reputação macabra inclui atrocidades feitas contra as vítimas de seus homicídios.
Para acrescentar insulto à injúria, ou humor negro à tragédia, Luciane Farias revelou com a maior naturalidade, em entrevista coletiva, que não só aguarda publicação da sua nomeação para o Comitê de Prevenção e Combate à Tortura do estado do Amazonas, como teve sua viagem a Brasília custeada pelo ministério de Silvio Almeida. Pode? É o Estado financiando, literalmente, o crime organizado.
Como se não bastasse, além do dinheiro do governo financiar as viagens da Dama do Tráfico a Brasília, o próprio tráfico financia sua Organização Não Governamental (ONG). O Instituto Liberdade do Amazonas passou recibo de pagamentos a líderes da organização criminosa Comando Vermelho, segundo investigação da Polícia Civil do estado.
Ou seja: é o Estado pagando a viagem, o tráfico pagando a hospedagem e alimentação de quem vai a Brasília defender supostos direitos humanos daqueles que mais limitam os direitos humanos à vida, à propriedade e à liberdade dos cidadãos brasileiros, que vivem amedrontados pela altíssima criminalidade no país.
Qual a reação das autoridades diante de tam anho descalabro? Providências imediatas para profunda averiguação e exemplar punição aos responsáveis, garantindo que a sociedade sinta-se segura e saiba que o episódio foi absolutamente isolado? Indignação com o desleixo do segundo e terceiro escalões do Ministério da Justiça com a ausência de checagem de antecedentes de quem entra no Palácio? Anúncios de novas medidas de segurança pública contra a audácia de traficantes e do crime organizado? Nada disso!
No meu caso e no de diversos outros parlamentares da oposição, Flávio Dino optou por bloquear-me após a manifestação que fiz, na qual afirmei que o impeachment de Lula e seus ministros ainda seriam insuficientes diante da bandalheira desse governo.
Ponderei que um governo que não dá o básico à sua população, segurança, e oferece o contrário, apoio à criminalidade, merece que seus integrantes delinquentes tenham o mesmo destino dos mais perigosos bandidos: a cadeia. A crítica da oposição, por mais ácida que seja, é parte da democracia.
No Fantástico Mundo de Dino, porém, prefere-se não se tomar conhecimento dos opositores (que antes merecem um frígido Gulag siberiano) e fechar-se na bolha dos bajuladores que inflam sua soberba que, proverbialmente, costuma preceder a ruína.
O governo ficou nas cordas. Seus representantes preferem atacar uma suposta extrema-direita fascista por repercutir as notícias, fingindo ignorar o fato de que foram órgãos de imprensa tradicionais e jornalistas profissionais que apuraram o caso e seguem divulgando seus reais, verídicos e palpáveis desdobramentos.
O governo mira e alveja o mensageiro (hoje a oposição, em breve a própria imprensa como nas ditaduras admiradas pelos petistas), enquanto a mensagem principal permanece intacta: Lula e o PT não somente deixam criminosos à vontade para circular nas ruas, como também financiam suas visitas aos prédios governamentais. Onde vamos parar?
MARCEL VAN HATTEM é deputado federal em segundo mandato pelo Novo-RS, bacharel em Relações Internacionais. É mestre em Ciência Política pela Universidade de Leiden; em Jornalismo, Mídia e Globalização pelas Universidades de Aarhus/Dinamarca e de Amsterdã – Holanda.