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Opinião

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho

Seria Papa Francisco comunista?

Dizer que Papa Francisco é comunista parece exagerado e fora do eixo. O debate é amplo e requer cuidados. Quem o diz? Teóricos e desinformados que não se importam em falar pelos cotovelos. Também os que não sabem ao certo o que estão fazendo, no percurso, os pobres de espírito, aos quais, no todo ou em parte, não se pode dar como certo que herdarão o reino dos céus.

Se alguém tem fome e lhe dão o alimento de que precisa, não acarreta e implica que o doador seja comunista. Se uma pessoa tem sede e lhe dão de beber, não pode atribuir ao benfeitor a prática do comunismo. O mesmo vale para quem não tem roupa e, na conveniência fraternal, alguém cobre seu corpo. Com todo o respeito, Mateus Apóstolo com a palavra.

Onde se viu isso? Nas pregações de papa Francisco, a quem chamam de Vigário de Cristo. Fosse assim, mãos que se entrelaçam em ajuda a seus semelhantes (há muitos aqui e acolá) seriam comunistas. Ou, numa visão bem próxima, os socialistas, quanto à distribuição igualitária, propriedade comum, ausência de classes sociais etc.

Com ideias voltadas a ideias conservadoras, não ligado a posicionamento de esquerda propriamente – afinal, joga no time do Evangelho de Cristo –, o papa Francisco é um líder universal sabidamente a favor da vida, dos carentes, dos mais pobres e de quem sofre abusos, síntese conceptual contra a desigualdade social.

Pode-se afiançar, sem incorrer em erro, o sumo pontífice não é de esquerda, de centro e nem de direita. Se o Evangelho for de esquerda, então ele é de esquerda. Se as sagradas escrituras apontarem para o centro é de centro; se os textos sagrados forem de direita, o líder da igreja católica é de direita. E assim por diante.

No contexto das ordens sacras, seus discursos são nitidamente voltados para a igreja da qual é líder. Segundo ele, “a Igreja, composta por homens e mulheres pecadores como todos, nasceu e existe para refletir a luz de outro, a luz de Jesus, assim como a Lua faz com o Sol”. Se um tanto discursivo e metafórico, o rótulo de comunista não lhe cabe nem aqui nem na China, nação asiática, pelo sim e não, a segunda principal potência econômica do planeta.

Infelizmente, na mídia e redes sociais existe uma avalanche de inconsequências que beiram a verborragia néscia e explícita. Como a de um famoso médico de minha estima, cuja especialidade implica na concepção da vida humana – diz ter deixado a Igreja Católica porque Papa Francisco é comunista. E se resolverem não mais procurá-lo porque pensam diferente dele, as ideologias não batem? Não dá. Entrechoques à vista.

No que concerne a jornalistas, é preciso que haja não objetivamente um freio no propósito de informar. Seria antidemocrático. Um certo cuidado nas análises é preciso. Formar-se antes de informar e noticiar. Infelizmente, no comum, estamos reféns de operários da imprensa que se descuidam da imparcialidade e jogam adiante ideias pessoais. Ou se vendem a peso de soldo, pura e simplesmente.

Para admiráveis corações e alma, relato óbvio para depurada reflexão é o estabelecido em Atos do Apóstolos: “Ninguém chamava seu ao que lhe pertencia, mas entre eles tudo era comum”. (4,32)

Tentar entender a celeuma criada em torno da figura hegemônica papal – se Francisco é ou não comunista – está a certeza contundente e aritmética de que sua posição é o de não contentar-se com “um retorno a um modelo desigual e insustentável de vida econômica e social, em que uma minúscula minoria da população mundial possui metade de sua riqueza”.

Em nível de comparação. Para se estar entre os mais ricos do mundo, o fator relatividade matemática conta. Em Mônaco, por exemplo, onde se concentram os bons da boca em matéria de dinheiro e riqueza, é preciso patrimônio da ordem de US$12,4 milhões. Já pelas bandas tupiniquins US$445 mil bastam. Algo como R$ 2.13 milhões. Traduzindo: dois terços das novas riquezas geradas no mundo foram acumulados por 1% da população. (Dado da Oxfam International, fonte CartaCapital, 2023).

Estrepitosa e turbulenta onda da desigualdade econômica e social. Patamar de deus nos acuda na produção de roncos desagradáveis do estômago. E bem acima de desumanos decibéis. Cerca de 800 milhões de pessoas todas as noites dormem com fome num mundo em que os extremos assustadoramente se atraem: riqueza extrema versus pobreza extrema.

Como dormir com um barulho desses? Tese a intranquilizar aos não dotados de fé, amor e caridade. Na imprevidência epistolar, para acumuladores de riquezas vãs, haja barbitúricos e soníferos afins. E disso saibam: quando do transporte às barreiras após a morte física, aquilo que amealharem em vida, aos céus e inferno não levarão um só níquel.
PS: Para Rogerinho, motoboy em Formiga. Vida inocente que se vai por imprudência e desequilíbrio de quem ignora: bebida e direção não se alinham.

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.com)

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