J.R. GUZZO
Comício de Barroso
O ministro Luís Roberto Barroso, que será o próximo presidente do Supremo Tribunal Federal, não faz nexo no que diz em público. Lembra, a cada manifesto que faz à nação, um desses oradores que sobem num caixote na Praça da Sé e ficam falando que o mundo vai acabar na próxima terça-feira.
O orador da Praça da Sé, é verdade, não dá prejuízo a ninguém – enquanto Barroso e os colegas, a cada vez que abrem a boca, pioram tudo o que já há de pior no Brasil. Mas, pensando um pouco, por que ele teria de dizer coisa com coisa? O Alto Comissariado que hoje governa o país não mantém nenhuma relação coerente entre as decisões que toma e aquilo que as leis em vigor mandam fazer.
Há quatro anos a Constituição Federal foi substituída por um inquérito policial perpétuo, que eliminou os mandamentos mais elementares de uma democracia. O STF, com base apenas na força armada da Polícia Federal, colocou a si próprio como um “Poder” da República. É óbvio, aí, que está valendo tudo.
No seu último surto, num comício na UNE, Barroso disse que “lutou contra o bolsonarismo”, para “permitir a democracia e a livre manifestação de todas as pessoas”. E desde quando é função de um ministro do STF “lutar” contra uma corrente política – que, por sinal, teve quase 50% dos votos na última eleição para presidente?
É uma aberração; é também uma confissão de conduta ilegal. Nada do que disse tem alguma coisa a ver com a lógica comum. “Só ditadura cassa mandatos”, disse ele. A Junta STF-TSE cassou o mandato do deputado federal Deltan Dallagnol. “Só ditadura cria censura”, afirmou em seguida.
O STF impõe, há anos, censura permanente na internet – proíbe que parlamentares se manifestem nas redes sociais, impediu que órgãos de imprensa publicassem informações desfavoráveis a Lula na campanha eleitoral e indiciou em inquérito um grupo de cidadãos que conversava no WhatsApp. “Só ditadura tem presos políticos”, disse ainda.
Há, neste momento, mais de 250 presos políticos nos cárceres do STF em Brasília; já houve quase 2.000, sem contar o deputado Daniel Silveira, preso durante nove meses, solto e preso de novo, em violação frontal ao que diz a Constituição. E por aí foi ele, numa desordem mental contínua e sem maiores sinais de vida inteligente.
Disse, depois, que não quis “ofender os 58 milhões de eleitores do ex-presidente”, e até mesmo que autoriza os brasileiros a terem “uma visão conservadora” do mundo. Mas aí a casa já tinha caído.
Barroso, com o seu pronunciamento, conseguiu um feito inédito: até o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, achou que assim também já era demais. É onde o Brasil veio parar.
J. R. GUZZO é jornalista.