GLEISSON KLEBERT DE MELO
Rio que banha minha terra, onde estão suas águas? Antes tão caudaloso, turvo e misterioso. Donde antes nadamos, peixes vários pescamos, rio meu para onde fluiu suas águas? Pois agora o que encontramos, são areias que em bancos avistamos. E um fiozinho de água cantando, num correr perrengoso. Um canto de agonia, das aguinhas chorando, que meu olhar triste espia.
Hoje piso na areia, que em seus tempos de cheia, mal podia se imaginar, realizar tal façanha. É tanta areia e pouca água, que a natureza retrata, em devasta imensidão, o mau uso do solo, o excesso de draga, sem contar o arrastão, que de tiram a vida deixando uma solidão e uma dor de quem fica a pensar, no que se pode fazer sem saber a direção.
Oh admirável Rio Jacaré! Mal molhando a canela, hoje se atravessa a pé. Onde estão suas águas? A compor o ambiente, que agora doente, só me faz recordar. Recordar as lembranças, de quando criança com meu pai ia pescar. Meu pai era pedreiro que ao fim do expediente, me aguardava contente com as varas e o também o embornal. Ali dentro trazia as minhocas, outras iscas, uma rosca ou pipoca. Para quando apertasse com um gole de café saciava a fome na beira do rio. Da construção onde ele trabalhava, de lá mesmo íamos na empreitada de trazer peixe para hora da janta. E era tanta a fartura de peixe. Rio piscoso que em suas águas turvas dava: mandi, pial, lambari e para os mais habilidosos com sorte, um dourado surgia a brilhar.
Onde estão suas águas? Onde estão, Rio Jacaré? As águas do tempo de abundância, que no calor escaldante, vínhamos para nos refrescar. Onde estão suas águas? Que nos trouxe medo, que tínhamos respeito, para nelas não afogar. Mas um medo que nos permitia arriscar, da balaustrada da ponte tinha sempre um ou mais a saltar.
Onde estão suas águas que formavam prainhas, pequenos bancos de areia para a gente brincar? Bate bola, pula carniça, escavar buraco para se enterrar. Até castelinhos formávamos com sua areia grossa. Suas prainhas eram um mimo do rio para seus filhos nelas brincar. Mas hoje inverteu-se operação, pouca água e muita areia que a gente titubeia se é possível voltar a brincar.
Onde estão suas águas meu amigo sinuoso? Rio ditoso que “nutriu” tantas terras com seu líquido vital, que formou povoados e tanto solo juncado foi por ti cultivado. Sobre ti tantas pontes, entre seu começo e seu fim quantas cachoeiras, curvinhas, rebojos, deltas de outros cursos de água, que por eles aumentastes volumes. Do fiozinho que nasce em São Tiago, encontrando o Rio Amparo, ao seu delta no Rio Grande, cumpres tua missão hidrográfica no panorama sul mineiro banhando seis municípios em toda sua extensão de 154 km.
Mas diante da imagem que hoje se retrata, quase sem água, muita areia e pouca mata, fico a pensar com meus botões: haverá, pois, esperança? Esperança de tornar à abundância, de águas, peixes e gentes. De voltar suas matas a segurar o barranco, evitando as enchentes e o acúmulo de areia? Haverá novamente abundância de vida e de alegria, da dança de suas turvas águas a dar medo e encanto, nas curvinhas e em seus rebojos? Voltaram os Dourados, sonhados pelos pescadores afamados por suas façanhas e histórias de bons pescadores? Podemos ainda sonhar com a vida nesse rio a reinar? Mas das perguntas que me voltam a mente, uma só vive a me apoquentar: O que posso eu realizar e contribuir para que meu rio volte a fluir?
GLEISSON KLEBERT DE MELO, natural de Santana do Jacaré/MG, tem dois livros publicados, membro da Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região, cujos membros se revezam na autoria de textos desta coluna aos sábados.