A esquerda brasileira chega a esta altura do século XXI, data maxima venia, afetada pelo que parece ser a falência geral das suas faculdades mentais. Não é mais, e já não é há muito tempo, apenas uma questão de se pensar maciçamente errado em tudo, como atestam os números, realidades e resultados daquilo que a esquerda propôs até hoje. A questão, agora, é que ela vai ficando cada vez mais estúpida. Suas ideias e causas, que não chegam a ser ideias e nem têm relevância para serem causas, vão descendo ao nível de inteligência de um tamanduá-bandeira.
É realmente uma tristeza, para quem falava de Marx, Engels e Lenin, falar no que a esquerda nacional fala hoje. Os três não acertaram uma, a não ser na produção de ditaduras, mas pelo menos escreviam coisas complicadas e tinham certificado de intelectuais ou revolucionários. Hoje, em vez de suas proclamações para o triunfo mundial do proletariado, a esquerda tem a linguagem neutra. Tem, é claro, todo um galpão lotado de coisas cretinas. Mas sua língua supostamente sem feminino e masculino talvez seja a que mais se destaca, quando se pensa em termos de curto-circuito cerebral em estado bruto.
A linguagem neutra não é apenas uma exibição de arrogância extrema – a noção de que a língua do país possa ser imposta às pessoas sem a menor participação sua, como se faz com as portarias que estabelecem qual é o horário de funcionamento das farmácias. Uma língua é, em tudo o que tem de essencial, um produto dos hábitos, pensamentos e a maneira de ser de um povo – não vem da vontade “do Estado” ou dos governos, nem das universidades e muito menos de algum grupinho de desocupados mentais em busca de uma causa.
A língua portuguesa é fruto de mil anos da prática falada dos povos de Portugal e do Brasil, basicamente – e a sua necessária organização através das regras da gramática, da sintaxe e dos dicionários. Não é propriedade de ninguém, nem pode ser alguma coisa que é “dada” à população por forças mais sábias. No Brasil, calha de ser também a língua oficial do país, de acordo com o que estabelece o artigo 13 da Constituição Federal. Ninguém é legalmente obrigado a falar português correto, segundo a gramática. Mas é uma atitude totalitária querer que se fale português errado.
O pior, em toda essa palhaçada que tanto encanta o casal Janja, colégios particulares com mensalidades de R$ 15.000 e os ministros mais excitados do STF, é a cretinice pura e simples da sua suposta “codificação”. O povo brasileiro sabe perfeitamente bem sua língua e o que é um artigo; até um analfabeto tem certeza de que se fala o carro ou um carro, a árvore ou uma árvore. Você alguma vez já viu um homem do povo falar diferente? Pois é. Ninguém precisa do STF para saber isso.
Acontece que, no português, o que define o gênero masculino ou feminino não é a vogal temática ou a letra que aparece no fim das palavras, e sim o artigo que vem antes delas. A pessoa fala o motorista, ou o pianista ou o desenhista – que acabam em A e são masculinos, como seriam femininos se quem guia, toca piano ou desenha for uma mulher e se a letra A vier antes. Também se diz a opção, que acaba em O e é feminino, ou o coringa, que acaba em A e é masculino. Enfim, e para ir ficando só por aqui, não é a letra E que faz uma palavra ser neutra, como determina o mandamento supremo dos “neutralistas”, com seu tão aclamado todes e todes. Isso é simplesmente uma estupidez. A couve termina em E e é feminino. O merengue termina em E e é masculino. Está bom assim?
É um sinal da miséria intelectual em que se afunda o Brasil de hoje que a nossa “suprema corte”, nada menos, tenha proibido as prefeituras de tornarem obrigatório o ensino do português gramatical em suas escolas. É razoável esperar que uma escola pública, paga com o dinheiro de todos, exija que se ensine de maneira correta pelo menos a língua oficial do Brasil. O STF acha que não. Acredita que a gramática é coisa de direita. Imagina que falar todes vai nos dar um país mais recivilizado, mais antifascista e socialmente mais justo.
J. R. Guzzo é jornalista