24 de julho de 2023
Foto: Reprodução.
Yngrid Horrana
PASSOS – Nesta terça-feira, 25, é celebrado o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. A data foi definida em 1992, no Primeiro Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, em Santo Domingo, na República Dominicana. Além da celebração, o dia também marca a luta contra o racismo, a violência de gênero e a hiperssexualização das mulheres negras na sociedade.
Para a estudante de enfermagem Jéssica dos Santos Carvalho, Passos é um local violento para mulheres negras. Ela relata ter sido vítima de racismo durante um passeio na rua Doutor Carvalho, no Bairro Belo Horizonte, e também ao fazer compras em supermercado.
“A primeira vez que eu sofri racismo foi na cidade de Passos. Eu cheguei e comentaram do meu cabelo. Eu sou de cidade grande, e na cidade grande cada um tem seu estilo, ninguém liga muito para o que você está usando. A vida é muito corrida lá, então ninguém perde tempo com isso. Mas aqui não. Aqui já me chamaram de ‘gente de cor”, conta Jéssica, que afirma não ter identificado, inicialmente, esse tipo de violência como racismo.
A estudante também disse que, nas primeiras vezes que foi vítima de racismo, não soube como reagir. “Comentavam muito do meu cabelo. Falavam demais do meu cabelo, até que eu cheguei a ficar um tempo saindo com ele mais preso. No início da faculdade foi bem complicado por conta do racismo, mas não sofri dentro da faculdade, em nenhuma hipótese. Foi na cidade mesmo. Caminhando, indo no mercado, o comentário de ‘gente de cor’, por exemplo, foi no mercado”, disse.
Conforme a fiscal de prevenção de perdas Letícia Esteves, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha ainda é novo, mas a data é importante. Letícia também afirma que a violência racial e de gênero contra mulheres negras é presente no cotidiano em Passos. “A gente se sente incomodada mesmo. Às vezes a gente passa e um cara mexe com a gente, assobia. Se estamos com uma roupa curta, se sentem no direito de mexer”, disse.
“Gostaria que parasse com esse preconceito, de ver a gente como carne, com olhar estranho”, desabafa a jovem, que também já presenciou esse tipo de assédio contra colegas de trabalho. Segundo ela, essa violência diária acaba causando constrangimento.
Embora o racismo seja recorrente no dia a dia de mulheres negras, a estudante Jéssica dos Santos Carvalho afirma que o Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha é importante para celebrar a importância, a dignidade e a resistência.
“Grandes mulheres negras foram superimportantes para a história do Brasil. Tivemos Dandara dos Palmares (uma das maiores líderes da luta abolicionista), Dona Ivone Lara, que foi uma grande enfermeira e sambista. Então, eu acredito que a partir de mulheres que lutaram e de mulheres que lutam ainda por isso, a gente consegue trazer a luta e a importância desse dia”, disse.
Segundo ela, o dia 25 de julho era uma data celebrada em seu ciclo social. Jéssica afirma que, na comunidade religiosa da qual fazia parte, o Dia das Mulheres Negras era celebrado periodicamente: “Eu fazia parte de um grupo da igreja há muitos anos e a gente comemorava lá no Rio (RJ). A gente fazia a missa para as mulheres negras latinas e caribenhas. Lá, o padre era muito jovem e ia muito na nossa onda. Então fazia a missa, a gente produzia pratos que resgatasse as nossas origens, e era muito legal, bem interessante”, conta.
De acordo com dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres negras – autodeclaradas pretas ou pardas – representam 28% da população. Conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgados na última semana, em 2022, o país registrou 1.437 feminicídios, sendo que em 61.1% dos casos as vítimas eram mulheres negras e 79,1% tinham entre 18 e 44 anos de idade. O número de feminicídios no ano passado cresceu 6,1% na comparação com 2021.
Em 2022, foram registrados 74.930 mil vítimas de estupro, o que representa o maior número da história. Entre as vítimas de estupro, 88,7% são do sexo feminino e 56,8% das mulheres estupradas são negras.
Dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) revelam que mulheres negras são as maiores vítimas de violência no país.
A Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (Disque 180 e Disque 100) atende, 24 horas por dia, ocorrências de crimes de racismo e violência contra a mulher. O Congresso Nacional de Justiça aponta discriminação, constrangimento, violência moral, patrimonial, sexual, física, psicológica ou social ocasionadas por razões de gênero ao crime de violência doméstica (Lei 11.340). Atos como apelidos pejorativos, ameaças, inferiorização e recusa a prestar serviços para pessoas negras enquadram-se na Lei do Racismo (Lei 7.716).