Natureza, conservação e cultura
O atual estado de conservação da natureza no mundo, coloca em perigo não apenas a diversidade das espécies animais, mas também das culturas de povos originários, que foram responsáveis pela conservação da natureza, que nós conhecemos hoje. A transformação ou extinção das paisagens, que co-evoluíram com esses povos, acaba por descaracterizar a cultura dos mesmos, que têm seu conhecimento e valores perdidos, enquanto suas tradições orais não apresentam registros escritos.
No Brasil, existem 274 línguas indígenas diferentes faladas por 305 etnias, segundo dados do último Censo Demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010. Isso nos demonstra uma grande diversidade cultural, ainda desconhecida. Com isso, temos que considerar que biodiversidade não é um problema de espécie, mas sim de um conjunto de diversidade de genes, das interações, dos indivíduos e das populações de espécies que constituem não apenas um ecossistema, mas uma paisagem, que está em constante evolução, uma vez que uma espécie não evolui sozinha e sim segundo uma tessitura de interações que passam por todas as formas de competição, parasitismo, mutualismo, predação, dentre outras.
Nesse sentido, o desenvolvimento que o Brasil almeja não pode se basear apenas no progresso uniformitarista, com o avanço da sua fronteira agrícola de maneira desmedida, que acarreta o desmatamento e posteriormente a queimada para instalação do cultivo agrícola em áreas de florestas equatoriais. A retirada da cobertura vegetal, aumenta a incidência da luz solar, que atinge diretamente o solo, aumentando as temperaturas da superfície. Essa situação, juntamente com a alternância de exposição dos solos ao sol e à chuva, causa uma rápida destruição da matéria orgânica, com a consequente redução da fertilidade natural dos mesmos. Ademais, a regeneração natural da fertilidade do solo mediante prolongados pousios é frequentemente muito lenta, exigindo entre 6 e 18 anos, dependendo das características dos solos e das formas como os mesmos são trabalhados.
Nesse sentido, caso o Brasil decida promover um desenvolvimento, respeitando e conservando a diversidade humana e biológica, se faz necessário preservar a existência das etnias ainda existentes, bem como suas tradições e costumes, que foram desenvolvidos ao longo do tempo. E isso exige uma postura de abertura, ou melhor, uma nova ética, que começa a nascer nas consciências aprisionadas por um antropocentrismo excludente e limitado, que nos tem direcionado a um mundo de desastres naturais, vulnerabilidades sociais e ambientais.
Com isso, não digo que a natureza a ser conservada é aquela presente em regiões inóspitas dos recantos de um Brasil sem fim, mas também me refiro as populações residentes nas grandes áreas metropolitanas, onde a população, convive em meio a uma selva de pedra, que intensifica o calor em dias quentes, afetando a saúde e causando desconforto aos moradores, principalmente, os de baixa renda. Como também, na parte da cidade esquecida, chamada de periferia, onde a falta de infraestrutura básica, transforma rios em valões ao ar livre, terrenos baldios em lixões e praças em saunas de concreto.
Edson Soares Fialho é Professor do Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Viçosa. E-mail: fialho@ufv.br