O calor não é igual para todos
A discussão sobre as mudanças climáticas privilegia a abordagem do tema pelo viés do ritmo do aquecimento, porém, não podemos imaginar que o aumento da temperatura do ar irá afetar a todos igualmente no planeta Terra. Muito embora as trocas de calor sejam universais, ocorrendo entre todos os tipos de corpos e objetos, elas não são de forma alguma uniformes.
As pessoas mais expostas ao estresse térmico são as menos responsáveis pelas mudanças de temperatura do ar ou pela configuração dos ambientes urbanos, o que leva ao agravamento das condições de saúde em eventos extremos. Por conta disso, as desigualdades térmicas são, portanto, cada vez mais centrais para a compreensão da vida para populações diversas, frequentemente marginalizadas, idosas ou migrantes.
Entretanto, o clima ao ser definido pela Organização Mundial de Meteorologia, por meio de uma média aritmética ao longo de 30 anos. Isso comunica que o mesmo é apenas compreendido pela mensuração dos fenômenos físicos, registrados por equipamentos meteorológicos.
Mas, ao considerar a vivência individual e coletiva das pessoas, o calor deixa de ser visto apenas como temperatura do ar, na medida em que se vivencia o mesmo. Com base nisso, Hulme (2015) em seu artigo Climate and Its Changes: A Cultural Appraisal, publicado na revista Geography and Environment, argumenta que, “…o clima — como é imaginado e sobre o qual se atua — precisa ser compreendido, antes de tudo, culturalmente…”, pois com o aumento das temperaturas as pessoas, especialmente as mais vulneráveis, vêm procurando se adaptar às condições extremas mais frequentes.
As práticas comportamentais para o gerenciamento térmico variam dependendo do contexto local, desde garantir a nutrição e água até reduzir ou alterar os padrões de trabalho, mudar ou migrar para espaços mais frios, ajustar as roupas, tomar banho com mais frequência, incentivar a ventilação e diretamente o resfriamento do espaço. Caso contrário, os seres humanos tendem a se desfamiliarizar do próprio mundo.
O calor não é um fenômeno apenas meteorológico, ele é também, social, estrutural, político, material, sensorial e subjetivo. Com isso, atinge de maneira distinta pessoas de diferentes idades, gênero e cor de pele. E para complicar, as condições socieoeconômicas também afetam agora não o indivíduo, mas a paisagem, que se apresenta fragmentadas socialmente, o que por sua vez, acarreta o surgimento de bolsões de calor, também conhecidos com ilhas de calor.
No entanto, se esse calor excessivo atingir uma região com condições sociais desfavoráveis, os efeitos serão mais significativos, já que a capacidade de adaptação, como o uso de ventiladores e ar condicionados, será inviável devido ao custo. Isso pode tornar as comunidades de baixa renda mais vulneráveis às variações climáticas e às condições extremas de calor ou frio. Portanto, a política urbana precisa se adaptar à nova realidade, desenvolvendo novas estratégias para atenuar o calor em regiões densamente urbanizadas e precárias, com o objetivo de criar ambientes térmicos mais agradáveis.
Prof. Dr. Edson Soares Fialho
Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Viçosa.
E-mail: fialho@ufv.br