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Juiz usa localização do celular e multa funcionário por má-fé sobre horas extras

11 de dezembro de 2024

Homem terá de pagar R$ 18 mil à empresa e R$ 36 mil à União. Juiz também oficiou MP e polícia para investigar se ex-funcionário cometeu crime / Foto: Divulgação

Mirielle Carvalho/JOTA

SÃO PAULO – Ao processar a WMS Supermercados do Brasil, um trabalhador afirmou que, de duas a três vezes por semana, batia o cartão de ponto e logo depois voltava a trabalhar, de forma que nesses dias cumpria mais de 12 horas por dia de jornada. Ao contestar as alegações, a rede de supermercados refutou a acusação, já que o homem trabalhava das 7h às 15h20 e fazia apenas uma hora extra em média três dias da semana, devidamente registrada. As informações são do site JOTA.

Diante das versões conflitantes, o juiz Régis Franco e Silva de Carvalho, da Vara do Trabalho de Embu das Artes (SP) oficiou as empresas telefônicas para obter os dados de georreferenciamento e identificar se o trabalhador continuava na empresa depois de bater o ponto. Foram oficiadas a empresa responsável pelo fretado dos empregados da empresa, as operadoras Vivo, Claro, Tim e o Google.

Com base nos dados de localização, o magistrado verificou que por meio de uma “amostra de mais 16 registros dos horários de saída do reclamante, restou clarividente a inverossimilhança das alegações do reclamante, tendo em vista que, em absolutamente todos os horários de conexão analisados após o registro da saída no cartão de ponto, o reclamante já estava fora da região do estabelecimento empresarial, não estando, portanto, trabalhando até 18h /18h o registro da saída”.

Por isso, condenou o trabalhador a pagar à empresa uma multa por litigância de má-fé, em pouco mais de R$ 18 mil, por alterar a verdade dos fatos, além de multa de R$ 36 mil à União para “acabar com a ‘lenda’ comumente tão propalada de que se pode mentir em Juízo impunemente”. O juiz também previu R$ 27 mil em honorários de sucumbência, embora o trabalhador seja beneficiário da Justiça Gratuita.

“O reclamante, ao mentir de forma tão reprovável quanto às anotações dos controles de jornada, alegando falsos documentos verdadeiros, tendo sido desmentida pelas diligências determinadas por este Juízo de forma a buscar a verdade real, nos termos do artigo 765 da CLT, litiga de má-fé, ao buscar obter vantagem indevida às custas da verdade”, declarou o magistrado.

Ele também determinou a expedição de ofício para a Polícia Civil do estado de São Paulo, Polícia Federal, Ministério Público do Estado de São Paulo e Ministério Público Federal para que instaurem as medidas pertinentes em face do reclamante para apuração da ocorrência dos eventuais crimes de calúnia (artigo 138 do CP), denunciação caluniosa (artigo 339 do CP), falsidade ideológica (artigo 299 do CP) e estelionato (artigo 171 do CP).

Isto porque o magistrado considerou que “ao negar a veracidade das anotações dos controles de jornada, reputando falsos documentos efetivamente verdadeiros, o reclamante também imputou à reclamada a prática de crimes, quais sejam, falsificação de documento (artigo 298 do CP), falsidade ideológica (artigo 299 do CP) e frustração de direito assegurado por lei trabalhista (artigo 203 do CP), além de ter feito afirmações manifestamente mentirosas em documento público”.

Litigância predatória

Além disso, o juiz determinou que a Secretaria efetue pesquisa nos processos da Vara do Trabalho, de modo a verificar, dentre os processos contra a rede de supermercados, aqueles movidos por trabalhadores com o mesmo escritório de advocacia que o trabalhador daquele processo, “de modo a verificar se as petições iniciais são tão semelhantes às deste caso e dos acima citados, em especial no que tange à jornada de trabalho e danos morais, certificando nestes autos e trazendo à conclusão deste magistrado para eventuais providências”.

Isto porque ele considerou estranho que na Vara há diversos processos contra a mesma rede de supermercados, com as mesmas alegações, todos defendidos pelos mesmos advogados. Por isso, ele também encaminhou a decisão aos juízes do Núcleo piloto de Justiça 4.0 e à Comissão de Inteligência do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2).