MARCELO AUGUSTO PINTO SOUZA
Alcoolismo e embriaguez no trabalho
Como a “Lei Seca” completou 15 anos de existência na última segunda-feira, dia 19/06/2023, nos inspiramos no tema e decidimos falar sobre o alcoolismo e a embriaguez habitual do(a) empregado(a) ou em serviço, assunto que frequentemente é objeto de consulta no escritório.
Diante disso, uma grande dúvida que surge no cotidiano das empresas refere-se ao que deve ser feito na hipótese de flagrar um(a) empregado(a) embriagado(a) no serviço. A primeira pergunta que recebemos nessa situação é se a empresa pode rescindir por justa causa o contrato de emprego do(a) empregado(a) flagrado em estado de embriaguez.
E, de forma direta, a resposta é: depende! E depende porque o alcoolismo e a embriaguez habitual ou em serviço são coisas distintas e, para o Direito do Trabalho, têm efeitos completamente diferentes.
Nesse sentido, é importante destacar que a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1967, reconheceu o alcoolismo como uma doença. Segundo a OMS, o alcoolismo é caracterizado pela dependência química da substância álcool. Em razão disso, o alcoolismo foi classificado pela entidade no Código Internacional de Doenças como “Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool – síndrome de dependência”, ou seja, uma doença capaz de retirar a capacidade de compreensão e discernimento do indivíduo.
Por outro lado, a embriaguez habitual do(a) empregado(a) ou em serviço, que não tem relação com o quadro clínico de alcoolismo (doença que causa dependência química do álcool), é vista como uma infração disciplinar. Ou seja, o(a) empregado(a) faz uso da bebida alcoólica em serviço ou vai trabalhar em estado de embriaguez, mas não é um alcoólatra – uma pessoa doente, e sim um(a) irresponsável.
Portanto, ao flagrar o(a) empregado(a) embriagado(a) em serviço, a empresa precisa analisar a situação e tentar identificar se está diante de um caso de alcoolismo (doença) ou de embriaguez habitual ou em serviço (infração disciplinar).
Essa análise pode ser feita pelo histórico do empregado na empresa, levando-se em consideração o tempo de serviço e eventual afastamento do trabalho por problemas relacionados ao uso de álcool; pelo diagnóstico de alcoolismo; por indícios de embriaguez pretérita envolvendo o(a) empregado(a); por atestados e/ou relatórios médicos, receituários de medicamentos e outros documentos que possam indicar ou não o quadro de alcoolismo; entre outros meios legais que possam esclarecer se o(a) empregado(a) flagrado(a) em estado de embriaguez é um alcoólatra (doente) ou não.
Conforme já adiantado, para fins trabalhistas, o alcoolismo e a embriaguez habitual ou em serviço demandam tratamentos distintos por parte da empresa. Atualmente, devido à própria concepção de doença que se tem sobre o alcoolismo, o(a) empregado(a) diagnosticado(a) como alcoólatra ou com indícios de sofrer dessa doença deve ser submetido(a) a tratamento, e não punido(a), uma vez que, em razão da doença, ele(a) perde a capacidade de compreensão e discernimento.
Com esse entendimento, inclusive, a Justiça do Trabalho já reverteu diversas dispensas por justa causa aplicadas a empregado(a) diagnosticado(a) com alcoolismo e determinou sua reintegração ao emprego. Logo, constatada pela empresa uma situação de alcoolismo, assim como o fato de essa doença estar afetando as atividades profissionais, é recomendável encaminhar o(a) empregado(a) ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para análise da situação.
Por outro lado, constatado pela empresa que a embriaguez habitual do(a) empregado(a) ou em serviço não tem relação com o alcoolismo (doença), a empresa poderá rescindir o contrato de emprego por justa causa, principalmente se a embriaguez expuser a riscos o(a) empregado(a), os seus colegas de trabalho ou a sociedade, em razão do tipo de atividade exercida, como no caso de motoristas, enfermeiros, cuidadores, operadores de máquinas de precisão, entre outros.
Por fim, é oportuno destacar que vem crescendo o entendimento de que o(a) empregado(a) diagnosticado(a) com alcoolismo não pode ser dispensado, ainda que sem justa causa. Ele(a) deve ser submetido(a) a tratamento por ser uma pessoa doente. Assim, cabe à empresa encaminhá-lo(a) ao INSS para tratamento médico (com afastamento do serviço, se for o caso) ou até mesmo para a aposentadoria por invalidez.
MARCELO AUGUSTO PINTO DE SOUZA, sócio da área trabalhista do escritório Souza Fraiz Advogados. E-mail: marcelo@souzafraiz.adv.br