Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho
Ainda que um passado não distante tenha mentido muito (mea-culpa publicamente registrado), mesmo que machuque e doa, temos que ser pela verdade.
Tenho motivo de sobra pelo desapreço à mentira e por tudo que ela produz de ruim e negativo. Estrago inimaginável. Não entram aqui demagogia barata e intransigência de ideologia político-partidária. A mentira relaciona-se diabolicamente ao ato de enganar, com o seu poder maléfico de destruição.
Induzir uma pessoa em erro é terrível. E fraudar, por seu turno, é tão funesto e destrutivo quanto desumano. Como se diz, inserir alguém a um resultado não correto.
Não dá. É desagradável. Mentira não é comigo. Não devia ser com ninguém. Nem mesmo a comercial. Aquela que manda dizer que não está quando está. Se bem que me ensinaram, em certos casos, costuma ser funcional. Para livrar-se, por exemplo, de um vendedor insistente, desses chatos, com o respeito à classe. Para tanto, basta dizer que não tem dinheiro.
Independente de como se dá a tapeação, no jogo está o terrível mal do condenável. É cruel. No superlativo, crudelíssimo. E tem muito a ver com vícios. No sentido de “falha negocial”, como diria na boa técnica do Direito e sem rodeios o laureado Pontes de Miranda.
Essa semana um cliente me liga, apavorado. Quer saber como ele ia ficar, depois de muito ralar a vida toda (adquirira sua casa pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH) da Caixa Federal), estaria agora prestes a ficar sem seu único bem.
Pedi que explicasse, já que, a princípio, não fazia o menor sentido tal informação. Depois de me enviar o material por ele recebido pelas redes sociais, em análise, a trapaça da desinformação. Vídeo maldosamente produzido por setores da direita radical daria como certo de que “Lula assinou decreto para colocar fim à propriedade privada”. Ou seja, quem tem deixaria de ter, imóveis etc.
De imediato, disse ao amigo tratar-se de fake news (notícia falsa), já que nem se quisesse poderia acontecer, ou seja, o presidente Lula, ou qualquer outro presidente, nem mesmo o Papa, tem poder para tanto. Trata-se de causa pétrea, caráter imutável.
E, assim, necessariamente, desmentiu-se o que precisava ser desmentido. E se deu o tradicional “mutatis mutandis” (com as devidas modificações).
Mais uma entre tantas a serem vindas para desalojamento de sortes. Pelo visto, fake news virou projeto de poder. E costuma ser de morte. Quem disse que não? Como as que podem ocorrer com pobres mortais que temem ser despidos de sua proeza maior que é a de ter a casa própria.
Quando é que vão levar a sério que não se deve roubar do outro o direito à verdade? E mais: não existe mentira inocente, sob qualquer pretexto. Mentira é mentira. Para o bem de todos e até mesmo da Corte Real, que se ponha fim nisso.
No descobrimento de todas as Américas, Thomas More, autor de Utopia (1516), riria de mim. E que tão bem descreveu uma república governada pela razão em busca de uma sociedade ideal. Sem meias verdades, diria que não há como pôr fim às fake news. Ou seja, informações motivadas por interesses políticos ou para fins fraudulentos.
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.com)