CINEMA
Com exceção dos raros conservadores, Hollywood há muito parece existir dentro de uma bolha ideológica: um bastião da política progressista onde judeus prosperaram, políticos democratas foram celebrados e estrelas abraçaram ideias avançadas no palco do Oscar e correram para apoiar movimentos como o Black Lives Matter.
Em sua imensa maioria, as pessoas do mundo do entretenimento podiam confiar que estavam alinhadas em termos políticos.
Tudo isso mudou abruptamente com o ataque do Hamas a Israel, em 7 de outubro. As reações ao ataque – e à retaliação de Israel – revelaram uma cisão que muitos em Hollywood não se davam conta que existia. Diante disso, muitos judeus se sentiram isolados na indústria que fundaram e onde há muito se sentiam seguros e amparados.
“Existem divisões sobre as quais nunca se fala”, disse o veterano roteirista Barry Schkolnick, cujos créditos incluem programas de TV como Law & Order e The Good Wife. “Os últimos acontecimentos as trouxeram à tona, o que é muito doloroso e desorientador”.
Muitos dizem que estão desiludidos – e furiosos – com a tímida condenação pública de Hollywood ao ataque de 7 de outubro. Não houve uma enxurrada de apoio de celebridades nas redes sociais.
De início, a maioria dos estúdios tentou evitar o assunto, permanecendo em silêncio. Um dos principais sindicatos, o Writers Guild of America (WGA), recusou-se a publicar uma declaração e manteve sua decisão mesmo diante da enorme reação de centenas de seus membros.
“O silêncio é ensurdecedor”, disse Jonathan Greenblatt, diretor da Liga Antidifamação, ao site de notícias de entretenimento The Wrap, em 12 de outubro.
Depois vieram algumas declarações e cartas abertas condenando os ataques do Hamas. Mas o estrago já estava feito.
Para o produtor Jeremy Steckler, “a falta de apoio dá a sensação de que estão dando um soco no meu coração e na minha identidade”.
“Nunca fui alguém muito atento à identidade ou à religião especificamente”, disse ele. “Sempre pensei que estava nesta pequena bolha e que todos nos apoiavam e aqui que é Los Angeles e tudo bem. Foi só na semana passada que acordei e me senti diferente”.
Embora o efeito seja mais pronunciado em Hollywood, onde há uma grande presença judaica, toda a América progressista sofreu convulsões semelhantes. No Capitólio, nos campi universitários e entre grupos ativistas e filantropos, surgiu uma divisão acentuada.
De um lado, um apoio ardente a Israel. Do outro, um grupo energizado que vê a causa palestina como uma extensão dos movimentos por justiça racial e social que varreram os Estados Unidos no verão de 2020. E ainda há outras pessoas, até mesmo de origem judaica, que pedem um cessar-fogo.
Em Hollywood, o exemplo mais forte da tensão do momento é a controvérsia envolvendo o WGA, sindicato que representa mais de 11 mil roteiristas.
Os roteiristas judeus reagiram com horror à recusa do sindicato em condenar os ataques a Israel. Alguns ameaçaram deixar o sindicato. Outros, entre eles o roteirista e produtor Marc Guggenheim (Arrow, Carnival Row), disseram que reteriam o pagamento das taxas. Mas um grupo anônimo pró-Palestina que se autodenomina ‘WGA pela Paz’ aplaudiu a decisão do sindicato, dizendo que seus membros tinham medo de se identificar porque seriam rotulados de antissemitas.