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Graciliano em domínio público

29 de dezembro de 2023

Record inicia o ano do domínio público com um box para colecionador./ Foto: Divulgação.

LITERATURA

Os herdeiros de Graciliano Ramos (1892-1953) bem que tentaram evitar que a obra do escritor alagoano entrasse em domínio público em 2024. Em 2018, acreditando que isso seria possível, eles renovaram o contrato com a Record até 2029. Depois de algumas idas e vindas que envolveram assessoria jurídica e conversas em Brasília, não houve outra opção a não ser aceitar que a partir do dia 1º de janeiro qualquer editora poderá publicar “Vidas Secas”, “Angústia” e “São Bernardo”, entre outros livros já editados ou ainda não pensados, e qualquer pessoa poderá fazer o que quiser sem autorização ou pagamento, filme, peça, musical.

Aceitar não. Acatar. “Aceitar eu não aceito, mas é a lei e tem que cumprir. Uma lei absurda”, diz o escritor Ricardo Ramos Filho (1954), neto de Graciliano e filho de Ricardo (1929-1992). Até agora, os direitos eram divididos em cinco partes. Ricardo e os dois irmãos abriram mão da sua fração para que a mãe pudesse receber mais. Descendentes de seus tios Luiza Ramos, Lucio Ramos, Júnio Ramos e Clara Ramos também recebem.

Ele explica que não é exatamente contra o acesso gratuito à obra de um autor no ano seguinte aos 70 anos de sua morte, como prevê a lei de direitos autorais. Poderia até acontecer antes, em sua opinião. Ele não concorda, porém, com a comercialização dessa obra onde quem ganha não é a família ou o público, mas, sim, a editora.

Diferentemente de outros autores esquecidos que acabam redescobertos neste momento em que a obra entra em domínio público, ou de escritores cuja obra acaba se popularizando nesta ocasião, como o que aconteceu com Virginia Woolf, ou se tornando mais acessível, caso de Freud, Graciliano Ramos nunca ficou de fora das prateleiras, a Record tem sido sua editora desde 1975 e já vendeu mais de 4,5 milhões de exemplares. O best-seller é “Vidas Secas”, com quase dois milhões de exemplares vendidos. Mais especificamente, 1.972.736 até a terceira semana de dezembro.

“Vidas Secas” está, justamente, na primeira leva de lançamentos que chegam às livrarias no início do ano. “Vai ser guerra”, afirma Ricardo se referindo à concorrência e à necessidade que as editoras vão ter de enriquecer suas edições para se diferenciar.

Sem alarde ou divulgação, talvez ainda esperando a reação ou alguma ação da família, Todavia e Companhia das Letras trabalham para lançar os primeiros livros de suas coleções dedicadas a Graciliano Ramos. A da Todavia é coordenada por Thiago Mio Salla, especialista na obra do escritor, e será inaugurada em janeiro com “Angústia” e “Vidas Secas”. Em fevereiro, a Penguin-Companhia das Letras lança “Angústia”, “Vidas Secas” e “São Bernardo”.

A Record, que quer se manter como referência e que ainda pagará os 10% do preço de capa para os herdeiros do escritor, saiu na frente das outras editoras interessadas. Até porque podia. Já está à venda um box para colecionador contendo seus três romances mais conhecidos: “Angústia”, “Vidas Secas” e “São Bernardo”, com prefácio, respectivamente, de Silviano Santiago, Hermenegildo Bastos e Godofredo de Oliveira Neto e texto inédito de Ivan Marques, professor de literatura brasileira, com histórias da composição dos livros e suas principais características literárias.