ADAÍLTON ALMEIDA
O romance do livro de geometria
O ano letivo havia começado, Augusto estava entusiasmado com o primeiro ano do Ensino Médio, porém já nos primeiros dias de aula encontrou um adversário à altura: A geometria. Nunca foi seu fã, porém ela estava se tornando um fardo cada vez mais pesado com o passar dos dias, tanto que foi visível o seu descontentamento ao chegar em casa depois da terceira aula da matéria.
Seu pai, sempre atento, ao saber o motivo, sugeriu um livro da sua época de escola, chamado “Descobrindo a Geometria”, para guiá-lo em seus estudos. Seguindo o conselho do pai, no dia seguinte, o garoto foi à biblioteca onde uma senhorita ruiva com óculos sobressalentes o atendeu. Deve ser este o livro que está procurando.
Ela entregou a ele um livro de lombada grossa e cor rubi. Augusto agradeceu e seguiu para a aula. O assunto daquele dia seria o cálculo de ângulos de um polígono. Assim que a professora disse o tema, o menino abriu o livro na página 37 e, entre hexágonos e octógonos, algo lhe chamou a atenção: Um pequeno verso no rodapé da folha.
Estava escrito: “Hoje ele se sentou na carteira à minha frente e me disse bom dia, quase não prestei atenção na aula, logo percebi que estava completamente apaixonada (…) 07 de fevereiro de 1989”.
Engraçado, Augusto pensou, aparentemente alguém utilizara aquele livro como um diário de confissões amorosas, e não estava nem um pouco preocupado em aprender geometria, logo viu que outras páginas também estavam escritas, numa letra inclinada e caprichosa. Na página 180, abaixo de um decaedro, estava outra confissão: “Descobri que ele se mudou para o meu bairro e se chama Eduardo Albuquerque”.
Nesse momento o garoto se assustou, era o nome do seu pai! Bem, poderia ser outro homem, mas a coincidência era grande, pois seu pai também estudara naquela escola anos atrás. Resolveu terminar de analisar o livro em casa, seu pai atualmente era viúvo e aquela não era a letra da sua mãe, sabia bem.
Já em casa distraído demais para se concentrar na geometria, pulou algumas páginas e na 405 encontrou o rodapé derradeiro: “Finalmente tomei coragem e lhe entreguei um bilhete com o meu telefone, espero que ele me dê retorno, obrigado por me acompanhar até aqui (…) 15 de dezembro de 1989, assinado J.Gonçalves de (…)”
O último sobrenome da aluna estava ilegível, porque havia sido rasgado um pedaço do papel.
Durante dias o menino ficou com aquele enigma na cabeça, sem contar para o pai, tentando imaginar quem seria a tal pretendente, mas resolveu entregar o livro.
A bibliotecária sempre sorridente o atendeu.
Gostou do livro?
Sim, mas está faltando um pedaço na última página.
Nesse momento um carteiro adentrou a biblioteca e anunciou: “Correspondência para Juliana Gonçalves de Sousa”.
A bibliotecária respondeu ser a destinatária da carta. No mesmo instante o menino pensou ter resolvido o mistério: Era a bibliotecária!
Mas ao ver de soslaio a assinatura da mulher no recibo do carteiro notou que a letra era diferente. Então resolveu abandonar a investigação, entregar o livro e se retirar.
Há algo mais em que eu possa te ajudar?
Não… quer dizer, saberia me dizer a quem pertenceu esse livro, na última página há uma assinatura, mas o nome não está completo.
Ah sim, eu sei. Pertenceu a minha irmã – Sorriu a mulher. Sério? e como ela se chama? Jaqueline.
Jaqueline… (pensou vagamente o menino). Adoraria conhecê-la, acho que ela também não gostava muito da matéria. – Completou. Então a bilbliotecária respondeu: Bem, acho que você a conhece, ela é a sua professora de Geometria.
ADAÍLTON ALMEIDA, escritor, integra a Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região, cujos membros se revezam na autoria de textos desta coluna aos sábados