CAROLINA DELBONI
É preciso devolver aos jovens o sonho de futuro
Em meio a crise climática, desigualdade social e desemprego, percepção de futuro dos adolescentes está nebulosa, mas é preciso recuperar a possibilidade de sonhar e devolver a eles o desejo de futuro
A crise climática, por exemplo, já é descrita por representantes do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) como a crise do direito de crianças e adolescentes. Um aumento descontrolado da temperatura no planeta causada por fatores humanos afetará proporcionalmente mais os jovens do que os adultos e um relatório do órgão já apontou que, no Brasil, 40 milhões de crianças estão expostas a um risco ambiental.
E o risco também é uma ameaça aos sonhos e expectativas dos mais novos. “Essa percepção com certeza fica prejudicada quando os jovens entendem que o futuro está atrelado a essa perspectiva de eventos climáticos e outras instabilidades ambientais”, afirma Danilo Farias, advogado ambiental que trabalha com a defesa da tutela de crianças e adolescentes frente à emergência climática.
Para além dos contratempos que enfrentarão da própria natureza, existe um risco que vem sendo desenhado de maneira sutil, quase que imperceptível: o apagamento do sonho de futuro. O aniquilamento do desejo de sonhar, de prosperar, de aspirar o que nem se sabe, só se espera.
Uma pesquisa do DataFolha, lançada no fim de 2022, ouviu jovens de 15 a 29 anos e mostrou que somente 25% esperam que o Brasil esteja melhor em um período de dez anos. Com isso, 76% demonstrou vontade de sair do país. O otimismo só se deu com relação ao próprio futuro: 65% achava que sua situação pessoal estaria melhor em dez anos. No entanto, poucos conseguem atrelar valor à educação. Eles não acham que a escola pode garantir uma melhoria de vida.
A educação desprestigiada na definição de futuro tem como sintoma a evasão escolar no Brasil, que aumentou de 2,3% em 2020 para 5,6% em 2021, segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Existe uma descrença no espaço escolar como formador humano. E por que será? Será que a escola não atende as demandas do mundo atual? Não engaja mais os jovens? É preciso repensar a educação e isso não é novidade – ou, pelo menos, não deveria ser.
Falar da percepção do futuro por parte do adolescente é também falar de como ele vive o presente para conseguir projetar sonhos e expectativas. E não é novidade que esse presente é desigual. “As desigualdades influenciam no pensamento do jovem, na forma como ele busca se conhecer e conhecer o mundo a seu redor”, diz a professora Rosângela Trajano, que trabalha com educação infantil no Rio Grande do Norte.
Fato é que existe um acúmulo de problemas e crises globais – climática, política, econômica – e elas são bombardeadas sob essa geração de crianças e adolescentes, chamados de Alpha e Z. Neles depositamos a solução de futuro, o salvamento da pátria, mas em nome do nosso capitalismo selvagem seguimos tocando a vida enquanto delegamos a eles as responsabilidades de mudanças.
O que cabe a nós, pais, adultos parte desta sociedade? É preciso devolver aos jovens, e às crianças, a possibilidade de sonhar o futuro. De desejar. De fazer planos, os mais loucos e descabidos possíveis. É urgente.
Mobilizar forças institucionais para esse assunto é, inclusive, uma forma de garantir a chamada máxima prioridade absoluta, descrita no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), segundo a qual crianças e adolescentes devem ser tratados pela sociedade e pelo poder público com prioridade pelas políticas públicas e ações do governo.
Enquanto isso, jovens por si só já se organizam. A geração atual já apresenta nomes preocupados com o futuro da humanidade, como o da sueca Greta Thunberg e da líder indígena brasileira Txai Suruí. “Quando os jovens abraçam essas causas, eles conseguem inconscientemente produzir esperança. Quando eles produzem essa esperança, eles estão construindo o futuro”, diz Rosângela Trajano.
A disposição pela mudança, porém, não é garantida. Uma geração que se vê diante de desigualdade e de um futuro ameaçado pode ter suas perspectivas de futuro limitadas. Para a psicóloga Cláudia Yaísa, é papel tanto dos familiares quanto das escolas estimular essa esperança: “Se um adolescente está em um ambiente em que ele se sente seguro, tanto fisicamente quanto emocionalmente, esse é um ambiente facilitador da esperança”.
Para Danilo Farias, os jovens reúnem todos os esforços para fazer a mudança acontecer. “Toda a perspectiva de ambição e transformação tem vindo da juventude, que quer uma transformação muito contundente de um cenário que já é catastrófico. Não há mais tempo para discutir nem relativizar nada. O tempo agora é de ação”.
É preciso devolver aos jovens o sonho de futuro. É urgente a mudança.
CAROLINA DELBONI escreve sobre comportamento Adolescente e Educação