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Dia a Dia

SILVIA HELENA DOS REIS

Entre o céu e a Terra

Naquela noite fiquei observando o céu de inverno que se mostrava generoso em tamanho e em quantidade de estrelas de brilhos intensos e ao mesmo tempo singulares e singelos. Imaginava como uma criação poderia ser tão bela, grandiosa e sublime. Quantos mistérios se escondiam em cada brilho, quanta energia, segredos e ensinamentos em cada constelação.

Quais galáxias se avizinhavam de nós, terráqueos? Seriam todas mais evoluídas ou seríamos nós os mais sábios e importantes? Pensei também nos princípios cristãos que sempre nortearam minha vida e se realmente temos feito valer esses princípios numa Terra ainda de tantas fraquezas, egoísmos, guerras, violências e desigualdades.

Sob a claridade maravilhosa de uma estrela deixei-me guiar o coração para toda aquela grandiosidade que se descortinava diante de meus olhos. Minha mente limpa e serena vagou por entre cada brilho, cada movimento do infinito. Ouvi sons nunca antes ouvidos. Imaginei cidades, oceanos, desertos, estradas, florestas, animais, seres de cores e tamanhos os mais distintos.

Fui enchendo o meu coração de um sentimento nunca antes sentido. Visitei montanhas, estreitos riachos, casinholas enfeitadas de flores. O espaço se expandia num encanto sublime. O que estaria acontecendo? Ante meus olhos tudo era tão perfeito! De repente vi-me diante de um pequenino jardim. Senti o coração disparar.

Um suor na palma das mãos. Sentei-me em algumas pedras que formavam um pequeno banco. Ao olhar o pequeno riacho percebi um homem se aproximando. Não tive medo. Seu olhar era manso e inspirava confiança. E me disse: — Está tudo bem.

Ele sentou-se ao meu lado e lhe perguntei:

– Que lugar é esse?
Ele me respondeu que era um lugar que existia dentro de mim. Que sempre esteve lá. Contei-lhe que apenas estava a observar o céu estrelado.

Ele disse que era sempre assim. Que bastava observar o céu para vermos dentro de nós. Instintivamente busquei o céu daquele lugar. Ele sorriu mansamente e disse que nada era mais puro e brilhante do que o sentimento do amor. E que não há nada que o Amor não possa modificar ou transformar. A noite transbordava harmonias. A Luz era leve e vibrava sensibilidade.

Perguntei o seu nome e Ele respondeu-me que tinha vários nomes. Mas gostava mais que o chamassem de Amor. Quis saber de onde Ele vinha. Respondeu-me que de todos os lugares. Disse-lhe que eu vinha da Terra e que na Terra não conhecia um lugar como aquele.

E então o Homem me disse que era porque os homens ainda não conheciam o verdadeiro amor. Pelo menos não todos os homens. Disse-lhe que às vezes me sentia muito triste ao presenciar tantos infortúnios, doenças, desastres provocados pelos homens, guerras e maus tratos aos animais, plantas, às águas e ao ar. Não tínhamos paz. Respondeu-me que os homens costumam falar de uma paz que é ociosidade de espírito e de uma resignação que é vício do sentimento.

– “Há homens poderosos no mundo que morrem comodamente em seus palácios, sem nenhuma paz no coração, transpondo em desespero e com a noite na consciência os umbrais da eternidade: há lutadores que morrem na batalha de todos os momentos, muita vez vencidos e humilhados, guardando, porém, completa serenidade de espírito, porque, em todo o bom combate, repousam o pensamento no seio amoroso de Deus”.*

Olhei para Ele e em seu olhar via-se tanta beleza que fizeram brotar-me água nos olhos. Pensei em todos os meus entes queridos e desejei muito que estivessem ali. Aquele homem trazia tanta paz, tanto amor, que era impossível dizer palavra alguma.

Levantei e coloquei-me de joelhos diante dele. Beijei os seus pés.
Fechei meus olhos tentando conter as lágrimas de uma felicidade que invadia todo o meu ser. Quando abri os olhos os primeiros raios de Sol entravam pela janela, era hora de recomeçar.

SILVIA HELENA DOS REIS, escritora e contadora de histórias. Membro da Academia Feminina Sul-Mineira de Letras e da Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região.

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