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DIA A DIA

Envelhecer é um castigo?

O velho de cinquenta anos atrás era mais velho do que o velho de hoje. É verdade. Outro dia examinei uma foto de meus avós paternos. Ele com 60, ela com 62. Sentados em um banco, ambos vestidos com roupas pretas, circunspectos, aparentavam uma idade visivelmente superior a real. Não eram os únicos a involuntariamente esconderem a idade, não no sentido de diminui-la, ao contrário, mostravam um envelhecimento físico superior ao etário, isso ocorria com todos de sua geração e das anteriores.
Em verdade, hoje a aparência reflete um estado de espírito não vigente à época. Explico: o envelhecimento antes de ser físico era psíquico. Envelhecia-se primeiro mentalmente e como consequência surgiam marcas no corpo, no modo de vestir, no comportamento em geral, impondo restrições conforme os padrões da época. Era comum ouvir-se “não fica bem na minha idade” fazer isso ou aquilo. Atualmente, deixa-se que a vontade se sobreponha às convenções. A autenticidade impera. Desta forma, as regras não são mais ditadas pela sociedade, o indivíduo sim é quem as impõe ao corpo social, por meio da reiteração de condutas até então consideradas impróprias.
Talvez essa mudança seja fruto de um impulso vital que dominou a consciência coletiva: o querer ter uma vida integral, sem restrições, independente da idade. Não se aceita mais o “colocar os chinelos” como uma passagem da vida que se levava para aquela que se apresentava necessária e inevitável. Esta era uma vida de restrições de atividades, de opções consideradas inadequadas, de escolhas tidas como impróprias. Estou dizendo que a idade já não é um marco de mudanças obrigatórias, como um imperativo social. As alterações de comportamento com o correr dos anos são de natureza física, permanecendo incólume a ânsia de viver, o entusiasmo e as aspirações futuras. Não se deixar abater pelas naturais limitações no campo da saúde e manter disposição voltada para a satisfação de novos anseios e alcance de novas metas é um estado de espírito hoje comum e inexistente em gerações passadas, quando o desinteresse e o imobilismo imperavam.
Desde sempre o homem preocupou-se com o envelhecimento. Na verdade, o envelhecer nos coloca em contato com a morte. Talvez o maior argumento para se levar uma vida saudável, útil e produtiva seja exatamente a perspectiva do fim. Não devemos antecipar o inevitável. Ao contrário, devemos sim demonstrar o nosso apreço à vida, vivendo intensamente o tempo que nos será concedido.
Envelhecer não é castigo, é crescimento e possibilidade de revisões, reiterações e aprimoramentos de pensamentos e de comportamentos.

ANTÔNIO CLAUDIO MARIZ DE OLIVEIRA é advogado criminalista, da Advocacia Mariz de Oliveira. Mestre em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Conselheiro no Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), membro da Comissão de Direito Penal do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e atuou como Secretário de Justiça e Secretário de Segurança Pública de São Paulo nos anos 1990. Foi presidente da AASP e da OAB-SP por duas gestões.

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