SILVIA HELENA REIS
Revezamento 23 por 24
Era uma vez um jardim. Para ser mais precisa um restinho de jardim. Só restavam mesmo a cerquinha, uma torneira e um gramado escasso permaneceram. Ah, e um besouro velho. Os moradores da casa haviam se mudado e tudo foi sendo perdido: a torneira ficou enferrujada e parou de jorrar água, as flores murcharam e secaram.
Da grama só restaram alguns montinhos: um aqui e outro lá. As folhas medicinais que ali cresciam também pereceram. O jardim foi ficando triste pois ninguém mais o visitava.
A casa também estava triste pois ali não havia mais crianças brincando, mamães fazendo sucos e geleias e nem o colorido das flores.
Mas como sempre há esperança um belo dia um movimento aconteceu por ali. Até o sr. Besouro resolveu dar uma olhadinha de sua janela cheia de teias de aranha. Não é que o jardim acordou com movimento de crianças correndo e um casal muito alegre abrindo o portão da casa?
A princípio o jardim ficou assustado, mas logo percebeu que as crianças eram até bem- educadas.
Logo foram se ajeitando pela casa. Limparam e organizaram toda a mobília.
A menina era muito alegre e logo descobriu o jardim. Ela pediu para o pai se podia cuidar das flores e do jardim. O pai muito animado disse que sim, mas, que o garoto também ajudaria.
No dia seguinte as crianças receberam ajuda do pai para consertar a cerca e também replantar a grama e afofar a terra. Antonio, o garoto, ficou assustado ao descobrir o sr Besouro Velho espiando da janela. Mas logo foi se acalmando quando dona Cerquinha garantiu que ele era bem inofensivo. E adorava contar histórias para crianças.
No final da semana estava tudo pronto: a cerca foi pintada, a torneira concertada, a grama cuidada e mudas de flores plantadas. Até o sr Besouro ganhou uma casa nova. De manhã a menina entrou no jardim e foi logo se apresentando: Sr Jardim, agora vamos cuidar de você todos os dias. Esse é meu irmão e eu sou a Rosa. Mas pode me chamar de Rosinha. Antonio, meu irmão, me ajudará a cuidar de todo o jardim.
E assim as crianças cuidaram com muito amor e zelo de todo o jardim. Vieram as borboletas, os pássaros com suas cantigas, os beija-flores com seus malabarismos aéreos e tudo passou a ser colorido naquele espaço. Até um cãozinho adentrou pelo portão fazendo festa para as crianças.
Assim também é nosso jardim interior. As plantas crescem, os galhos novos surgem. Surgem os brotos e os botões, as flores e os frutos. Os frutos amadurecem e são colhidos. E o processo se repete. É o poder de renovação da natureza humana. Temos o poder de regenerar, de cicatrizar, de amadurecer, de transformar. Mas, para que haja renovação é preciso propósito: progredir sempre. Podemos mudar do opaco para o mais radiante.
É preciso AMAR. O amor que pode ser sentido. O amor transformador.
Somos permanentemente amados. Jesus soprou seu hálito de amor em nós. O amor de Deus é gratuito.
As crianças ao cuidarem do jardim da casa acima vão colocando terra fofa no pé das plantinhas com cuidado para não sufocar os brotos. Conversam com o pai para pedir orientação sobre qual a tinta usar na casinha do sr. Besouro. Tintas podem ser tóxicas e matá-lo.
É ilusão acharmos que mudando o ano, mudam as nossas dificuldades. Nossas contas serão pagas pela conjuntura dos planetas, nossa saúde será recuperada sem mudarmos nossos hábitos de alimentação errônea.
Que as guerras irão cessar e esperar as nações se entenderem ao rugir dos fogos que maltratam a criança autista, o cãozinho que se debate sem poder explicar a dor que ele sente ao ver os homens passarem indiferentes a sua dor e as feridas que consomem seu corpo da mesma forma que consomem o corpo do magnata que se debate em febre e terror da morte sem que seu dinheiro possa comprar o medicamento da cura.
É ilusão acharmos que a cor da nossa pele abrirá as portas do céu para adentrarmos ao paraíso.
“É preciso amor pra poder florir”.
A “Estrela de Belém” brilha para nos mostrar o caminho certo.
Mas insistimos em querer encurtá-lo e transformá-lo de acordo com nossa limitada vontade.
Que nosso NOVO ANO seja o novo jardim transformado pelo amor da Criança de
Belém que vive dentro de nós.
SILVIA HELENA DOS REIS, escritora e contadora de histórias. Membro da Academia Feminina Sul-Mineira de Letras e da Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região, cujos associados se revezam na autoria de textos desta coluna aos sábados