11 de novembro de 2023
Comer era uma ladainha, principalmente se fossem coisas saudáveis e a tal “comida de sale”, como diziam sonoramente e com ênfase na casa de meus pais ou na casa do Vovô Zeca. Naquele fim de tarde o cardápio da janta era a típica e nutritiva sopa de fubá com couve rasgada. Ótima oportunidade para minha rejeição infantil. Mas …
– Mamãe!, a sopa está uma delícia!
Esperava um comentário benfazejo, uma surpresa pela limpada do prato e o comentário positivo sobre iguaria caipira naturalmente rejeitada por crianças. Mas o que ouviu foi isso:
– É porque vamos ao circo. A sopa ficou mais gostosa.
Mamãe tinha razão. Me lembro do gosto da sopa e da textura da couve rasgada no meio do fubá cozido e mais ainda da expectativa do circo. Era a primeira vez. A família ia toda. Meu pai, minha mãe, Gabriel meu irmão e Tia Wanda. Não me lembro se Guilherme outro irmão meu do grupo dos oito que compunham a irmandade, e que ainda morava conosco a época, também fora.
A expectativa era enorme. Na escola muitos colegas já tinham ido. “Até o Pe. Nagib foi!” repetiu Wanderlei amigo inseparável de Gabriel naquele fim dos anos 80. E fomos todos. Do espetáculo quase não lembro mais. Mas da expectativa do espetáculo e da sopa sorvida com ansiedade naquela janta que precedia o passeio em família, esses estão vivos na memória.
Diz um ditado que o melhor da festa é esperar por ela. Esperei e me apaixonei. Se tornou ancora muito bem alocada no cérebro, um gatilho de alegria genuína. A palavra circo, a lona, os palhaços, as luzes, as cores, a música alegre, as gargalhadas e o suspense nos números circenses disparam aquele momento mágico da infância, o dia de ir ao circo pela primeira vez.
Dia desses minha filha Helena foi ao circo pela primeira vez. Cheia de expectativas e ansiedade próprias desse momento. Repetiu o dia todo que ia ao circo. E foi! Foi e ao final declarou com doce voz infantil, num misto de inocência e encantamento olhando a lona armada:
– Todos os dias quero ir ao circo papai!
Encantou-se com cada grito, cada artista, com as luzes, com os brinquedos. Encheu os olhos com a trapezista Luiza (Guardou bem o nome….rs) que dançava no pano roxo. Com o Homem-Aranha arriscando-se no trapézio e descendo tal e qual o da televisão, de cabeça para baixo em sua teia.
Chorou de rir e de emoção com o palhaço, espantou-se com o homem que comia e cuspia fogo e paralisou-se olhando os malabaristas. Ao final riu, cantou e encantou-se com Patati e Patatá e Cia com suas músicas infantis, coreografias e a mágica apresentação para os pequenos fãs.
Não houve sopa de fubá, mas comeu tudo que tinha no circo, de pipoca a maçã do amor. Comeu até o que não costuma comer e o que costuma rejeitar por afirmar que não gosta. Mas eu entendo, o circo muda nosso apetite. Também não gostava de sopa de fubá, muito menos de couve rasgada.
Mais de trinta anos e 220 Km separam os espetáculos de nossa primeira vez no circo. Eu em Santana do Jacaré e Helena aqui em Passos. Ambos saíram encantados de sua primeira experiência do circo que chegou na cidade e seus espetaculares artistas.
“- Todos os dias quero ir ao circo!” (Helena)