23 de setembro de 2023
ADAÍLTON ALMEIDA
Quem nunca se deparou com questões existenciais, não é mesmo?
Desde prematura idade a curiosidade nos toma pelo braço e nos diz: “vamos ali ver o que é aquilo?”
Isto porque, como seres racionais, buscamos razão para tudo, queremos desvendar aquilo que se esconde diante dos olhos, a expectativa e a surpresa aguçam a imaginação humana desde os primórdios.
Do mesmo modo, talvez com certo receio até, de cavar mais fundo, buscamos um sentido para a existência e, por mais que nos apoiemos em uma ideia de utilidade, quando, por exemplo, nos perguntam: o que você faz da vida? E respondemos: sou comerciante, professor, médico, etc., a verdade é que esta pergunta é profunda demais.
O que você faz da vida prezado leitor?
Pois bem, a vida pode ser vista de diversos ângulos, a citar alguns: religioso, filosófico e biológico. Porém o seu sentido, por vezes, ainda parece estar oculto por trás de uma cortina de fumaça. Pergunto-me se tal vista é importante, se ver, ou, em outras palavras, enxergar a vida sob determinado ângulo, é realmente necessário.
Será que ao vê-la passar diante dos olhos, encontraremos algum sentido? Ou o sentido está no ato em si de viver, como um fim em si mesmo?
Esta curiosidade que às vezes permeia a maioria das pessoas de se perguntar “o que estou fazendo aqui?” talvez não exija uma resposta teórica, ou, nem mesmo uma resposta, talvez exija uma dose de pragmatismo. Suponho que entender a própria existência, a si e os outros, é uma questão de entrar ou não em contato, como já dizia Clarice Lispector, que entendê-la “não é questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato, ou toca ou não toca”.
Dessa forma, compreendo que o sentido da existência, apesar de intangível, pode ir se descortinando à medida do próprio ato de sentir, seja dor, seja alegria, mas é preciso entrar em contato.
Isso tudo me lembrou de um fato recente.
Dia desses quando estava na sala de coleta de um ambulatório clínico, para realizar exames de praxe, fiquei compadecido com uma senhora, pois era a quarta vez que a enfermeira tentava coletar o seu sangue, mas as veias ardilosamente se escondiam, já na quinta tentativa eu me encontrava mais receoso do que a própria paciente.
Foi quando uma enfermeira, requisitada pelas outras, entrou na sala para cumprir o desafio de coletar o sangue da pobre mulher.
As suas colegas disseram-lhe que não estavam conseguindo enxergar as veias da paciente, a enfermeira solicitada, por sua vez, apalpou o braço da mulher cuidadosamente, de um lado e de outro e, milagrosamente, para o alívio de todos, inclusive o meu, na sua primeira tentativa realizou o feito, em seguida disse para as suas colegas sorrindo: “às vezes a resposta não está em ver, mas sim no sentir”.
Aquela profissional da saúde, mal sabia, mas naquele momento estava me dando a melhor lição para as minhas questões existenciais.
Cada um tem o livre arbítrio de imprimir significado à própria vida, cada jornada é única e muitas vezes solitária, não há como saber sempre e antecipadamente o que se verá, ao virar a esquina, por isso creio que é preciso saborear cada passo.
É possível aprender com as flores e com os espinhos. A existência, a meu ver, está longe de um paraíso ou de um castigo e não há um manual de existência, somos inseridos no mundo e precocemente ou tardiamente aprendemos a seguir adiante, carregando na bagagem experiências e lições.
Digo em um de meus poemas, que a vida é como uma sopa, quando quente sopramos, quando fria esquentamos, alguns ingredientes separamos, outros, para nossa sobrevivência, precisamos engolir, mas o ideal é ir saboreando, lentamente, pois rápido demais podemos nos queimar.
Assim, compartilho humildemente do entendimento que a melhor forma de entender a vida é vivendo sem pressa de desvendá-la, como protagonistas das nossas escolhas.
Apesar de haver muitos materiais e pessoas empreendidas no campo da autoajuda, apresentando seus produtos práticos sobre como viver, como alcançar ascensão financeira, ou mesmo a felicidade, ainda continuo fugindo de teorias e acreditando que o tato, o sentir, de forma responsável, é a melhor forma de experimentar a existência.
ADAÍLTON ALMEIDA, escritor, integra a Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região, cujos membros se revezam na autoria de textos desta coluna aos sábados