PAULO ROBERTO CORÓ FERREIRA
A pescaria e a Missa
No Carmo era amplamente sabido que o Padre Leopoldo adorava uma pescaria. Se tivesse uma pescaria e ele não fosse convidado, cortava relações, não conversava, ficava chateado mesmo.
Um dia, Dr Luís Introcaso, Fazinho (pai do Dito do cartório) e Zé Otávio (pai do Mirtinho e Robinho pintor) estavam programando uma pescaria para um domingo no aterro de Santa Quitéria.
Todos eram hábeis pescadores e suas pescarias eram frequentes e cobiçadas. Zé Otávio era o técnico da companhia de luz e era quem mantinha a antena de TV funcionando na Serra da Tormenta nos anos 1960 e 1970. Doutor Luís era o respeitado médico da cidade.
Falava calma e mansamente e sempre foi muito admirado pelo seu despojamento, pois atendia a todos sem distinção de qualquer tipo. Sua remuneração variava de zero a qualquer tipo de moeda: sabão feito em casa, frango, leitoa, verduras, etc. Fazinho (Josafá dos Santos) era o dono do cartório que atualmente é administrado pelo Dito e andava sempre muito bem arrumado, óculos escuros e era muito comum vê-lo fumando.
No domingo combinado, quando já estavam saindo para pescar em um carrão preto do Zé Otávio, um Buick de mil novecentos e qualquer coisa – muito parecido com aqueles carros de filmes de gangsteres americanos – lembraram-se do Padre Leopoldo. Dr Luís argumentou:
– Olha, temos que convidar o padre, senão já sabem, né?
Fazinho, de ray-ban, com aquela pinta do Morgan Freeman e com um cigarrão no canto da boca:
– Vai atrasar, mas não podemos deixar o padre. Toca para a casa paroquial, Zé Otávio.
E seguiram para lá. Chegando na praça, o padre meio apressado, com sua longa batina preta, caminhava com passos firmes e apressados rumo à igreja, pois já estava meio atrasado para celebrar a missa das 10 horas. Zé Otávio dá uma buzinada, para o carro ao lado do padre e Fazinho acena e diz:
– Padre Leopoldo, estamos indo ao aterro dar uma pescada. Dizem que está bom para piabas e tubaranas. O senhor gostaria de ir conosco?
O Padre coçou a cabeça, olhou para a igreja, olhou para o relógio, lembrou da missa que já estava atrasada, olhou pro carrão preto do Zé Otávio com um lugar sobrando para ele e disse resoluto:
– Eu vou de qualquer jeito, mas tenho que celebrar a missa das dez, então me esperem um pouquinho que eu já volto.
Entrou na sacristia só pensando nas piabas e tubaranas puxando o anzol, se paramentou e “sapecou” a missa em 8 minutos e meio. Assim como entrou, saiu: muito apressado. Na igreja ninguém entendeu a pressa do padre:
– Será que estaria com algum problema intestinal?
PAULO ROBERTO CORÓ FERREIRA é carmelitano, pós-graduado em Ciência da Computação pela UFMG. É autor do livro “Viagem pela Alma Carmelitana”, lançado em 2021, com as histórias de sua terra.