2 de abril de 2024
Ézio Santos
Especial para a Folha
S. J. B. GLÓRIA – Na próxima terça-feira, dia 2, será lembrado o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, ou simplesmente, Dia Mundial do Autismo. Hoje, a Folha traz uma história comovente sobre três famílias, sendo duas com atitudes de maus-tratos a duas crianças, e uma que acolheu ambas com muito carinho e amor, tirando-as do extremo sofrimento físico e psicológico como pais adotivos.
Os fatos tiveram início no final de 2019, quando um casal do município foi chamado em Arcos (MG) para tomar ciência de que uma garota de 10 anos e um menino de 8, estariam sendo judiados pelo padrasto, irmão do homem que hoje cuida das crianças. A situação era tão grave que ambas perderam a guarda da mãe biológica, e do pai, que se separou da mulher sem oferecer nenhum apoio aos três.
A mãe adotiva, Senilda Coelho Rosa da Silva, de 52 anos, casada com Valmir da Silva Coelho, de 40, pais de uma filha, de 31, enfermeira que trabalha na Santa Casa de Passos, e um filho, de 29, veterinário em Belém (PA), conta que depois de 24 anos voltou a reviver a rotina de cuidar de dois filhos, mas em situação completamente diferente a partir de 1993, quando nasceram Milena e Jackson. Os adotivos Geovana e Pablo, de 15 e 12 anos, respectivamente, foram diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no início de 2020.
Senilda relata que Geovana e Pablo, filhos de uma mulher pobre em São João Batista do Glória, juntamente com o esposo, não tinham condições de cuidar delas. Então, optaram por levá-las para os avós paternos que moram em Passos, porém não foram capazes de oferecer assistência necessária às crianças.
“Pelos relatos de pessoas ligadas aos idosos, ficamos sabendo que as crianças eram judiadas desde que nasceram. Tudo de ruim elas recebiam dos pais biológicos e dos avós. Agressões físicas, psicológicas, passavam fome, não tinham higienização diária e eram tratadas como animais domésticos. Cresciam com sofrimento extremo e desumano”, contou Senilda.
Os idosos devolveram os netos para a mãe, residente no Glória, que na época, namorava um outro homem. Em 2019, ele conseguiu um emprego em Arcos e, para lá, os quatro se mudaram. A situação ao invés de melhorar, piorou ainda mais. As crianças continuaram a ser maltratadas, e para tentar amenizar o sofrimento, foram matriculadas em uma creche. Fora do horário de proteção educativa e psicológico, Geovana e Pablo continuavam a padecer nas mãos da mãe e do padrasto.
Por esses e outros motivos, o padrasto foi preso, deixando a mãe dos meninos grávida do terceiro filho, que também era ter o mesmo destino, porém em Arcos não tem cela para mulher. Ela ficou sob em casa e com restrições impostas pela justiça, até surgir uma vaga no presídio de Belo Horizonte, onde deu ao terceiro filho, que também nasceu com o TEA e Síndrome de Einstein, característico dos interesses obsessivos, dificuldades de comunicação e problemas para se relacionar.
Diante da grave situação, Sinilda e Valmir, irmão do padrasto preso, foram chamados pela justiça em Arcos. A par dos graves problemas, eles foram determinados a voltar à casa das crianças todos os finais de semana. No final de 2019, trouxeram Geovana e Pablo para o Glória onde ficaram entre o Natal e a passagem de ano.
“As coisas mudaram totalmente e as crianças se recusaram a voltar para Arcos. Em conversa com a promotora daquela cidade, nos autorizaram ter a guarda definida das crianças, enviaram todos os documentos para o Fórum de Passos e passamos aos cuidados delas como se fossem nossos filhos. Parece que Deus nos iluminou e o amor por eles até parece igual à Milena e Jackson”, afirmou contente a Senilda que se considera cristã evangélica.
Alteração de nome
De tanto sofrer nas mãos dos pais, avós e padrasto, a mãe adotiva revelou que Geovana se tornou uma criança muito emudecida, triste, e apesar de falar, não revela nada sobre o seu passado. “Ela se comunica sobre o assunto apenas através de desenhos a lápis. Não comenta nada desde quando se lembra ser humana, talvez porque sofre de autismo nível 2 e mente infantil como se tivesse 4 anos. Depois que veio para a nossa casa, se tornou outra pessoa, e graças a generosidade do povo gloriense, tem tudo que uma criança quer, inclusive o Pablo, que sofre de hiperatividade, autismo leve e Transtorno de Oposição Desafiante (TOD)”, explicou.
Ano passado, Geovana pediu a Senilda para mudar de nome, dizendo que o registro de Gabriela era triste, e o atual significa felicidade. “Perguntei à promotora se podia, ela autorizou. Ela já tem o CPF e em breve vamos conseguir uma nova carteira de identidade. Além de estudar, juntamente com o Pablo, são alunos municipais, recebem
toda a assistência da prefeitura através dos profissionais como psicólogo, psiquiatra e assistência social”, contou a mãe adotiva.
Já se aproximando da fase da adolescência, está cadastrada na Lei Orgânica de Assistência Social (Loas), lei federal brasileira que estabelece a proteção social básica e especial para pessoas em situação de vulnerabilidade social. Recebe um salário mínimo que serve como ajuda de custo.