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Andar direito é bom

Foto: Reprodução

Não vou dizer que não tenho vergonha de certas coisas porque tenho. Por exemplo, do meu andar. Acho ridículo. Ando desajeitado e, por mais que eu tente consertar, não consigo. Antes que tirem conclusões precipitadas, nasci assim e se morrer assim será lucro.

O Gê da Caixa Federal, em Formiga, dias atrás, me confidenciou que tem vontade de fazer academia para
corrigir a postura corporal. Curioso é que ele anda bonito, correto, empertigado, sem nenhuma irregularidade.
Seria uma indireta? Só pode. Gê é educado, conversa manso, só o necessário. Não é de atravessar a fronteira do básico. No particular, penso o quanto eu teria de malhar para andar direito, com o corpo bem aprumado. Melhor é arranjar um fisioterapeuta a título de suporte. Barbie é bárbara nessa área.

Lembro de exibir muito minha carteira de habilitação ao guarda que me parou na rodovia. Educadamente, o
agente perguntou se era eu na foto. Imagem pavorosa de feia. Encurvado, fragilizado, parecendo alguém embutido para dentro de si em deprimente situação. Fazer o quê? Quando retorno aos fatos de que
o Gê está certo em querer modelar gestos e posições e não apenas agregar massa muscular ao corpo. Mesmo
porque massa corporal, depois de um certo tempo da vida, não há de ter graça alguma. Velho bombadão é deplorável. Pelo menos eu acho.

Em seguida, passo a averiguar outra hipótese. A vergonha que temos de contar ao médico certas coisas. Como
os problemas que atacam aqueles que se encontram na casa dos “entas”. Generosamente – como são bonzinhos! – no eufemismo, costumam chamar os “entas” de “segunda metade da vida”, a velharada ou o pouco que dela resta. Então fiz as contas. São tantas coisas que atribuem aos idosos. Se a gente ainda “coisa”; se sonha que está “coisando”; se passa pela cabeça da gente de alguém ainda querer “coisar” com a gente. Isso aí… Sem a pretensão de faltar ao respeito.

Coisas intoleráveis, sem mais nem por quê. Na verdade, a gente sofre desnecessariamente. Não precisa ficar amarfanhando as ideias. Somos vítimas de muitas circunstâncias inexplicáveis. Apenas para não deixar de
lado outra coisa. Quem mora sozinho tem o hábito de falar sozinho. Os médicos chamam isso de solilóquio. Eu
me lembro de Tia Mariinha, ela ficava muito nesse processo de solilóquio. E havia explicação que ela mesma fazia questão de contar. Falava sozinha por ser e estar frequentemente sozinha. Não havia ninguém para dividir os assuntos do dia com ela. Daí, já viu.

Em relação a mim não é diferente. Ponho e me estabeleço sozinho um bom tempo em casa ou até mesmo
quando saio para passear. A verdade é que amo minha companhia e disso dou notícia e conto prosa. Não falo
por falar. Gosto e me acostumei a ficar só, com minhas abstrações e manias. Encontro substância nesse estilo de vida.

A exemplo da juventude desenfreada e que se desembesta nas redes sociais, não sou de ficar fora do esquema. Em busca de prazeres virtuais, submeto-me a navegar em altos mares e longínquas terras e lugares. E não se
trata de dar adeus à vida social. Afinal, não se despede de quem, de algo ou de alguém que não se tem.

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho, advogado, escreve aos domingos nesta coluna. (luizgfnegrinho@gmail.
com)

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