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A vida dos nazistas na América do Sul

Richard Baer, Josef Mengele e Rudolf Höss, respectivamente, em 1944 / Foto: Reprodução/US Holocaust Memorial Museum

Nos anos 1970, na divisa entre São Paulo e Diadema, um homem chamado Peter – ou Seu Pedro – mudou-se para uma casa à beira da Represa Billings. Lá, revezava-se entre consertar o telhado, dar ordens ao jardineiro para aparar as plantas no quintal, escrever cartas e ler livros em uma vida discreta e reclusa.

Cerca de uma década antes, um conterrâneo de Pedro se mudou para a Bolívia e vivia uma rotina oposta. Don Klaus Altmann foi catapultado a um quadro estratégico para a diplomacia e economia bolivianas. Os caminhos dos dois não se cruzaram por aqui, mas tinham um laço violento em comum: eram nazistas disfarçados na América do Sul.

Após a Segunda Guerra Mundial, a fuga de nazistas para nosso continente gerou incontáveis teorias da conspiração, séries, filmes e livros que retratavam, por exemplo, o mito de Adolf Hitler ter sobrevivido ao escapar para a Argentina.

Na Europa, se propagava a ideia da Odessa: uma suposta rota de fuga oficial criada para livrar os nazistas de serem presos e condenados. A lenda há muito foi descartada, mas uma pequena parte dessa história é verdadeira.

Vivendo em La Paz, Don Klaus Altmann era, na realidade, o torturador nazista Klaus Barbie. Já Pedro, que fazia consultas médicas, recebia visitas do filho e de amigos, era a identidade falsa do pseudocientista Josef Mengele, autor de experimentos brutais contra judeus e ciganos nos campos de concentração de Auschwitz.

No livro Surazo (Manjuba), lançado em maio, a austríaca Karin Harrasser descreve como Klaus Barbie se infiltrou na Bolívia, orquestrou assassinatos, torturas e concedeu serviços paramilitares aos primeiros carteis de drogas da região.

Com passaporte diplomático, geria negócios como a companhia de transporte “Transmaritima” desde o fim da década de 1960. O negócio se aproveitava da campanha nacionalista para abastecer os desejos autoritários dos ditadores bolivianos, como Hugo Banzer, em restabelecer a saída boliviana para o mar, perdida para o Chile, em 1884.

O nazista mantinha contrato com países vizinho e esteve no Brasil até ser alçado ao posto de conselheiro do serviço secreto boliviano. “Como empresário, ele abriu portas para o mercado europeu de drogas que jamais foram fechadas”, explica Harrasser.

A investigação da autora começou com interesse em missões jesuíticas alemãs na Bolívia, mas durante a pesquisa se surpreendeu com um vídeo encontrado no YouTube: um homem com barbas e cabelos brancos, um jeito excêntrico e um “ar oculto”.

Era o cinegrafista Hans Ertl, um montanhista considerado talentoso, que se mudou da Alemanha para criar gado nos “recônditos da floresta tropical”. Hans também havia sido um oficial nazista e continuava a frequentar os círculos da colônia alemã no novo país. Entre os amigos, Klaus Barbie.

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