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“A cidade do saber e da saúde”: Memórias dos 167 anos do município de Passos, MG

17 de maio de 2025

Vista aérea da área central do meio urbano de Passos. Cartão Postal, s/d. Foto histórica: Yokohama

Autores

Edson Soares Fialho – Professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Carlos José Ferreira Lopes – Psicólogo, escritor e colunista. Presidente da Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região.

Sebastião Wenceslau Borges – Escritor memorialista passense, reconhecido por suas contribuições à preservação da história e da memória cultural de Passos.

 

Ao revisitar e relembrar a Geo-história, a ciência que estuda o espaço e o tempo, as mentalidades são renovadas. Assim, novas interpretações revelam uma maior compreensão da influência do espaço, seja ele natural, cultural, econômico ou qualquer coisa que afeta o local onde o ser humano vive.

Assis (2007, p. 35) nos recorda que, em 1894, o município de Passos, localizado a oeste de Minas Gerais, era formado por extensas fazendas, onde o gado proveniente dos estados de Goiás e Mato Grosso era criado. Naquela época, na cidade, existiam dois grupos políticos dominantes: os irmãos Manuel Lemos de Medeiros e Francisco Lemos de Medeiros, também referidos como “lavouristas”; e os irmãos Francisco Gomes de Souza Lemos e Jayme Gomes de Souza Lemos, referidos como “governistas”, que defendiam os interesses comerciais, industriais e urbanos.

No momento, a economia de Passos se baseia na dobradinha entre agricultura-modernização agrícola (lavouristas), que produz café, leite e derivados, além de outros produtos agrícolas que são exportados em larga escala, e comércio/indústria (governo), com ênfase na fabricação de móveis e vestuário.

No entanto, antes, uma grande parte do Sertão Oeste de Minas Gerais era conhecida como Campo Grande, uma região com terras aparentemente à disposição. Portanto, podia ser conquistada por qualquer indivíduo e, como resultado, lidava com uma variedade de conflitos, sejam eles explícitos ou não (Amantino, 2008).

É importante salientar que, entre os séculos XVIII e XIX, apesar das suposições das autoridades coloniais e dos discursos sobre a ocupação do território, o sertão de Minas não estava desprovido de habitantes. Existia um “vazio de civilização”, no sentido de que a estrutura social, política e cultural de seus habitantes não correspondia às expectativas das autoridades, sendo possível encontrar pessoas de todas as origens.

Campo Grande era uma expressão genérica que não exigia uma área específica. Segundo Warren Dean (1998, p. 120), o território da região do Campo Grande abrangeria 860 km2. Da mesma forma que outras regiões, foi devastada pela procura de ouro e, posteriormente, pela agricultura e pecuária.

Isso esclarece por que, durante o século XIX, os exploradores encontraram o sertão do oeste com paisagens desoladas e sem a vegetação nativa. Durante sua jornada, Saint-Hilaire (1975, p. 121) mencionou a presença do capim gordura, encontrado em praticamente todos os lugares. De acordo com ele, este capim “…apenas floresce em terras saturadas por sucessivas plantações ou queimadas inadvertidamente, o que, infelizmente, não é incomum…”.

A ocupação do Oeste de Minas, que é marcado pelo Bioma Cerrado, com características particulares deste tipo de vegetação, como árvores de troncos robustos e tortuosos, gramíneas e arbustos, causou um impacto significativo e, atualmente, restam apenas pequenas áreas de vegetação.

Hoje, 14 de maio de 2025, após 165 anos da época dos coronéis do antigo sertão do oeste mineiro, Passos (Figura 1), situada perto da divisa com São Paulo, atravessa uma nova fase. Os investimentos governamentais na formação de instituições de ensino técnico e superior, juntamente com a chegada de novos negócios privados, estimulam e impulsionam a economia e a prestação de serviços. Trata-se de uma chance de não só recordar, mas também de apresentar o passado e as expectativas para o futuro.

O Sul e o Oeste de Minas Gerais se sobressaíram na desconcentração industrial que ocorreu na Região Metropolitana de São Paulo, graças à sua localização geográfica e ao acesso facilitado. Essas circunstâncias promoveram o avanço industrial nas cidades do interior de Minas Gerais. Isso resultou em uma “guerra fiscal” entre esses municípios, que se dá através de alguns benefícios proporcionados pelos governantes.

 

Figura 1: Localização do município de Passos, MG.

Essa dinâmica resultou em transformações funcionais nas cidades da região, além de mudanças na malha urbana. Algumas dessas cidades desenvolveram-se para responder a essa nova etapa de industrialização descentralizada. Este processo sugere que as cidades estão passando por uma profunda mudança econômica, caracterizada por uma maior divisão territorial do trabalho e uma maior integração na rede urbana. As cidades estão competindo mais e se complementando. O fenômeno geral da urbanização é multifacetado, distinto e de múltiplas dimensões.

Conforme o IBGE (2022), o município de Passos conta com uma população de 111.939 pessoas, levando em conta tanto a área urbana quanto a rural. Sua densidade populacional é de 83,66 habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2022), cobrindo uma área territorial de 1.338.070 km2 (IBGE, 2022).

Ao analisar a progressão da população ao longo do tempo (Figura 2), nota-se uma tendência de crescimento da população urbana, que se estabelece a partir da década de 1970. Entre os censos de 2010 e 2022, houve um aumento de 5% na população total, mesmo com a contínua perda de população rural, que segue em declínio.

Atualmente, mais de 95% da população vive em áreas urbanas, que ocupam uma área de 24,51 km2 (Figura 3), que vem crescendo de forma proporcional ao crescimento da população urbana desde 1985. Levando em conta as informações do censo do IBGE (2022) sobre a distribuição populacional (Figura 4) e a renda (Figura 5), baseadas nas unidades censitárias para o município, nota-se que a população se concentra mais na zona urbana.

 

Figura 2: Evolução da População Total, Urbana e Rural de Passos, MG.
Fonte: IPEA-Data. Disponível em: http://www.ipeadata.gov.br

 

Figura 3: Evolução do uso e cobertura da terra, no município de Passos, MG.

Logicamente, o maior adensamento da população na área urbana, causou modificações na paisagem, que se adaptou a demandas, que variavam de acordo com os diferentes tempos.

Ao ver as imagens de um pretérito não tão recente, como na Figura 6, onde se observa uma visão parcial aérea do centro da cidade, onde se destaca ao centro a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário, observa-se uma ocupação ainda plana, com a presença de apenas uma edificação. O primeiro prédio de Passos MG, Edifício Abrão Jabur:

Todos os tijolos da obra vieram de trem da cidade de Casa Branca-SP. Na época em Passos e Região ainda não tinha fábrica de tijolos. A primeira experiência para muitos na Cidade de como era “pegar o elevador” aconteceu aqui, neste edifício.

Está localizado na Rua Presidente Antônio Carlos, Praça Monsenhor Messias Bragança “Praça da Matriz”, no coração de Passos(MG). Sua construção se deu entre os anos de 1962 e 1966.

Figura 6: Vista aérea da área central do meio urbano de Passos.
Cartão Postal, s/d. Foto histórica: Yokohama

Na figura 7. Vista panorâmica da cidade de Passos, MG. Já com várias edificações./Editor: Ambrosiana

“Memória que se ergue”

Na figura 8, podemos apreciar mais de perto o Edifício Abrão Jabur, o primeiro arranha-céu de Passos-MG, símbolo da modernização e do progresso que marcaram a história da cidade.” E que segundo os piadistas da época, esse edifício  tardaria o nascer do sol nas cidades vizinhas.

figura 8. Vista do Edifício Abrão Jabur- Foto histórica: Yokohama

 

“Patrimônio e Transformações no Centro de Passos”

As figuras 9 e 10 retratam a Praça Geraldo da Silva Maia, projetada e construída em 1951, durante a gestão do então prefeito que dá nome ao local. Inicialmente chamada de Praça do Rosário, por causa da igreja ali existente, hoje abriga o prédio da Prefeitura Municipal. No centro da praça, destaca-se uma fonte luminosa, restaurada em 2014. Tanto a praça quanto a fonte são tombadas pelo Conselho Municipal do Patrimônio Histórico.

Na mesma época, foi inaugurada a antiga estação rodoviária de Passos, que funcionou até 1977. A partir daí, as operações foram transferidas para um novo prédio ao lado do Mercadão Municipal. Em 14 de maio de 2007, o espaço foi reinaugurado como Terminal Rodoviário de Passos, localizado atualmente na Avenida Arlindo Figueiredo, 1001, no bairro São Francisco.

Após a desativação da antiga estação, o prédio foi ocupado temporariamente pelo Corpo de Bombeiros, mas acabou demolido na década de 1980. A decisão gerou controvérsias, já que o edifício era considerado um marco arquitetônico com valor histórico para a cidade. Em seu lugar, foi construída a Casa da Cultura, que hoje abriga a, Biblioteca Pública Municipal Professor Francisco Soares de Melo além de sediar atividades e eventos culturais, oficinas, exposições e projetos de formação artística ligados à Secretaria Municipal de Cultura.

A demolição da antiga rodoviária ainda é lembrada por moradores como uma perda simbólica para a memória urbana de Passos, reacendendo debates sobre a preservação do patrimônio histórico da cidade.

 

Figura 9. Vista aérea da cidade : Praça Geraldo da Silva Maia] : Terminal Rodoviário : Passos, MG – [Década de 50]

 

Figura 10 . Terminal Rodoviário : Passos, MG. Editor: Arte-Foto Studio Ronaldo

“CPN: História e Arquitetura”

Nas figuras 11, 12.  O Clube Passense de Natação (CPN), fundado em 1939, destaca-se como um dos principais espaços esportivos e sociais de Passos. Seu atual edifício-sede, localizado na Rua Dr. Saturnino, 300, esquina com a Avenida Comendador Francisco Avelino Maia, foi projetado na década de 1960 pelo arquiteto Dáude Jabbur e teve suas obras concluídas por Paulo Esper Pimenta entre 1964 e 1972. Com área construída de 5.290,60 m², o projeto modernista inclui um salão monobloco com pé-direito duplo e estrutura em “V”, onde funcionam escritórios e serviços do clube, além de dar acesso às piscinas e quadras. O salão envidraçado se tornou tradicional palco dos grandes bailes da cidade.

Figura 11. Clube Passense de Natação : Passos, MG, Editor: [s. n.]

Figura 12. Atuais piscinas do Clube Passense de Natação : Passos, MG

Conclusão

Celebrar os 165 anos de Passos é mais do que revisitar marcos históricos ou paisagens urbanas: é reconhecer a resiliência de um povo, o valor da memória coletiva e o potencial de uma cidade que, em constante transformação, constrói seu futuro com base nas raízes de seu passado.

Referencias:

Fonte: IBGE Cidades. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/passos/historico

ASSIS, Leila Maria Silva. Poder e coronelismo no oeste de Minas Gerais: a relação entre história e literatura na obra de Mário Palmério. Monografia do Curso de Especialização lato sensu em História Regional: Sociedade, Cultura e Memória do Curso de História do Centro Universitário de Belo Horizonte – UNI-BH, 2007. Disponível em: https://uniube.br/mariopalmerio/monografia/lelia_maria_2007.pdf

AMANTINO, Marcia. O mundo das feras: os moradores do sertão oeste de Minas Gerais –Século XVIII. São Paulo: ANNABLUME, 2008.

CORRÊA, Roberto Lobato. Globalização e reestruturação da rede urbana: uma nota sobre as pequenas cidades. Revista Território, Rio de Janeiro, ano IV, n.6, p.43-53, 1999.

DAMIANI, Amélia Luisa. Cidades médias e pequenas no processo de globalização. Apontamentos bibliográficos. In: LEMOS, Amalia Inés Geraides et al. (orgs.).: América Latina: cidade, campo e turismo. CLACSO, Consejo Latino-americano de Ciências Sociales, San Pablo. Desciembre 2006.

DEAN, Warren. A ferro e a fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Cia das Letras, 1998.

SAINT- HILAIRE. Viagem as nascentes do Rio de São Francisco. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1975.

História com clube passense de natação “CPN” Fonte: Conteúdo publicado pela Divisão de Processamento de Dados, extraído em sua inteira integridade, do CD-ROM do Projeto de Pesquisa sobre a Arquitetura Modernista de Passos – MG (gravado e editado em Maio/2010).