PAULO ROBERTO CORÓ FERREIRA

O Cine Guarani, e a nota de falecimento

Nas décadas de 1960 e 1970, informações que eram de interesse geral da população do Carmo eram veiculadas pelo serviço de alto-falante do Cine Guarani. Anunciava-se, por exemplo, festas na cidade ou nos bairros rurais, comunicados da prefeitura, vinda de médicos que iriam atender aqui, entre outros eventos. Também eram comunicados os falecimentos e a própria propaganda do cinema, onde eram anunciados os filmes.

E em um sábado triste e chuvoso em Carmo do Rio Claro e ao som da “Avfalecimetnoe Maria”, que deixava o dia ainda mais triste na cidade, Tãozinho anunciava um falecimento ocorrido no dia anterior.
Os anúncios eram repetidos 8 vezes: duas com o alto-falante direcionado para o bairro Cascalho, duas direcionadas para o bairro São Benedito, duas direcionadas para a Vargem e duas direcionadas para a Rua Nova.

Durante os anúncios de notas de falecimento toda a cidade permanecia tristemente silenciosa, como que espiando a morte. O som da “Ave Maria” ainda permanecia por algum tempo e causava nos habitantes aquela sensação de reavaliação de suas vidas. Era um repensar e uma reflexão sobre o que se tinha feito até então.

Pois bem, sábado nublado e chuvoso, após o anúncio, Tãozinho para aproveitar que já estava no cinema mesmo e precisava anunciar o filme do dia, deixa a “Ave Maria” tocando mais algum tempo, aguarda alguns minutos e desliga.
Daí a pouco troca a música e anuncia o filme. Era um faroeste italiano com Lee Van Cleef. Sem se dar conta da relação entre o velório e o filme faz o anúncio mais ou menos assim:
– E não percam hoje no Cine Guarani a partir das 20 horas um “coboiaço” italiano: “A morte anda a cavalo”.

PAULO ROBERTO CORÓ FERREIRA é carmelitano, pós-graduado em Ciência da Computação pela UFMG. É autor do livro “Viagem pela Alma Carmelitana”, lançado em 2021, com as histórias de sua terra.