4 de outubro de 2023
WASHINGTON L. TOMÉ DE SOUSA
Relata a história que D. Pedro II e o Barão de Mauá, duas grandes figuras do Brasil império, contemporâneos, viviam às turras um com o outro, dadas as suas visões divergentes de mundo, o primeiro, um humanista, o segundo, um expoente do capitalismo. Ao final de suas vidas, já bem mais maduros, após longos anos de desentendimentos e aborrecimentos entre ambos, resolvem se conciliar e trabalhar conjuntamente por um projeto de construção de um Brasil melhor.
Mas, aí, já correndo em busca do tempo perdido, nem Proust (Marcel Proust, escritor francês, autor do clássico da literatura mundial “Em busca do tempo perdido”) os pôde ajudar. Após o entendimento, em poucos dias, partiram ambos. D. Pedro, para o exílio, com a queda do Império e a proclamação da República. Mauá, com a morte. Gastaram-se e desgastaram-se nas divergências ao longo de suas vidas quando, juntos, em pontos consensuais, poderiam ter feito muito mais pela nação.
Passado pouco mais de um século, cá estamos nós, no mesmo dilema, guardadas as devidas proporções e mudando o que deve ser mudado. Uma nação dividida, lutando com e contra ‘espantalhos’ (“linguagem neutra”, “fantasmas do comunismo e do capitalismo”, “ideologia de gênero”, revisionismos “ad eternum” de tudo… talvez até se chegue ao cúmulo de alguém vir a processar Deus, para Adão reaver a posse do Éden, do qual fora expulso) e perdendo precioso tempo, recursos e vidas, em antagonismos inúteis e infindáveis, que nada constroem. “E la nave va”… ao sopro de todos os ventos… em direção a lugar nenhum. Enquanto isso, “Tempus fugit” (o tempo voa).
Observando-se a cena sócio-político-econômica nacional e internacional atual, verificam-se duas tendências, inconciliáveis, de regime de governo, grosso modo, como forma de resposta às demandas das sociedades: regimes autoritários ou totalitários (China, Rússia, Turquia, Irã, Venezuela…) e sociedades democráticas de diversos matizes (EUA, Suíça, França, África do Sul, Uruguai…).
Diante de tudo isso, a tentação de superação das dificuldades de toda ordem que nos acometem no Brasil, ou pela via imediata do autoritarismo, ou pelo caminho da desconstrução da ordem vigente e da sua substituição, paulatinamente, por uma ideologia totalitária, é uma ameaça constante.
Já, por outro lado, a via do estado democrático de direito passa, necessariamente, pela construção (muitas vezes demorada e complexa) através do diálogo e respeito aos divergentes. E, sem uma agenda comum mínima, não evoluiremos. Os modelos de regimes de governo estão aí expostos em todo o mundo e a todos, para nos espelharmos. O que almejamos para nós e a qual corrente estamos aderindo?
Repetição reforçadora
Como nação heterogênea, multirracial e multicultural, admirada pelas demais justamente por conseguir integrar em seu tecido social toda essa diversidade – e encontra-se aí a sua força! -, urge reforçar e aperfeiçoar os laços que nos unem e que foram construídos com grande esforço ao longo do tempo: a nossa história comum, a nossa língua, a integridade do nosso território… como sociedade integrativa de todos os elementos heterogêneos que a compõem, mormente criando mecanismos que favoreçam a ascensão socioeconômica dos menos favorecidos, eliminando o malefício e elemento de ruptura da desigualdade social, e que promovam a inclusão de minorias.
E não nos afastando do nosso espírito característico de solidariedade ao próximo e como raça humana. Políticas e ideologias que privilegiem a desagregação e a polarização devem ser rejeitadas. Ditaduras não são bem-vindas, sejam elas do quartel, do proletariado, da toga, ou da… (de qualquer origem). Vamos, juntos, construir o nosso caminho, o nosso modelo, sem interferência alienígena.
Saúde e paz a todos!
WASHINGTON L. TOMÉ DE SOUSA, bacharel em Direito, ex-diretor da Justiça do Trabalho em Passos, escreve quinzenalmente às quartas, nesta coluna