3 de maio de 2023
WASHINGTON L. TOMÉ DE SOUSA
“Quanto mais corrupto o Estado, maior o número de leis”. (Tácito, pensador romano, de 56 a 117 d.C)
O Brasil é o paraíso das leis, regulamentos, resoluções… os mais diversos possíveis, editados diuturnamente, em profusão, que procuram abarcar a tudo e a todos os aspectos da vida em sociedade e das pessoas físicas e jurídicas, confirmando a máxima acima de Tácito.
Nossos legisladores aparentam desconhecer, ou por ignorância mesmo ou por interesse próprio, uma lei fundamental da natureza humana: a de que uma lei externa ao indivíduo (legislação) deve encontrar correspondência em uma lei interna a este mesmo indivíduo ou ente (princípio), para ser observada com efetividade. Caso contrário, será meramente um instrumento impositivo, sem resultado educacional e transformador. É o que se vê repetindo-se no Brasil.
Escrevo este artigo à véspera de votação no Congresso do Projeto de Lei das Fake News, sem saber, portanto, ainda, do seu desfecho. Creio que não será aprovado.
Projeto polêmico, traz em seu bojo, como ponto principal, e justo, a “obrigatoriedade de moderação de conteúdo na internet para que sejam identificadas, excluídas, ou sinalizadas postagens e contas com conteúdo considerado criminoso” (Agência Câmara de Notícias), mas carrega o perigo, real, de limitação da liberdade de expressão e de suas normas serem utilizadas de forma arbitrária ou autoritária para perseguir inimigos políticos (afinal, estamos no Brasil, onde, muitas vezes, as segundas intenções se ocultam por trás de boas proposições).
Valores, onde a lei encontra validação (reedição)
“Diz uma anedota, de fundo moral, que certo homem herdou uma fazenda abandonada, tomada pelo mato, com as edificações caindo aos pedaços. Após muito trabalho e investimento de recursos materiais e financeiros na sua restauração, transformou aquela fazenda em referência de beleza e qualidade. Recebeu, então, visita de amigos que, admirados diante de tanta beleza, exclamaram: – Que maravilhoso presente de Deus você recebeu! Ao que respondeu: – Sim, mas vocês precisavam ter visto quando Deus tomava conta disso aqui sozinho!
Escrevo o presente artigo em local agradável, à sombra de frondosa árvore, brisa suave e refrescante, contrastando com o escaldante calor destes dias de verão, rodeado pela natureza, embalado ao som de várias espécies de pássaros. Nada melhor que estas condições para escrever. Área quase central de Passos, trata-se do antigo Country Clube, hoje Uemg.
Apesar do encanto do lugar, não pude deixar de notar que o mato e a degradação vão tomando conta da área verde do local e das suas estruturas físicas. É que a natureza, pela força vital que lhe é inerente, tende a retomar o que naturalmente lhe pertence. E as intervenções que o homem nela produz exigem constante manutenção. Se deixadas ao léu, degradam-se.
Exemplo atualíssimo e aterrador são as barragens das mineradoras no Brasil, que estouram e arrebentam com a vida de homens, animais e cidades, destroem e degradam o meio ambiente por gerações. As duas mais recentes, da Samarco, em
Mariana e, posteriormente, da Vale, em Brumadinho. Negligência, falta de manutenção…tragédia anunciada.
Humanos, somos, também, seres da natureza. E com os animais ditos irracionais compartilhamos parte da nossa constituição – os instintos.
Mas, para além dos instintos naturais, na escala da existência, estamos em nível mais elevado, se considerarmos que, embora o nosso corpo seja constituído, fisiologicamente, por elementos químicos (96% oxigênio, carbono, hidrogênio e nitrogênio, principalmente em forma de água, além de outros elementos em menor proporção), não somos um mineral (não obstante haja pessoas que tenham um ‘coração de ouro’, ou que sejam um ‘bloco de gelo’, ou até ‘aguadas’, mas, aí, já estamos no âmbito dos valores, e não da matéria – rsrsrs!).
Ainda que nos alimentemos de vegetais e deles nos utilizemos nas suas mais variadas formas para a nossa sobrevivência, não somos vegetais, embora, a título de exemplo, alguns sejam considerados ‘madeira de lei’, ‘árvore frutífera’, e outros queiram viver, espontaneamente, de forma vegetativa, ou o façam de forma involuntária em decorrência de doença incapacitante (valores, novamente, todos). Somos entes da autoconsciência.
Valores e desvalores permeiam nosso cotidiano. Vida, liberdade, honestidade, dignidade, fidelidade… uns, de caráter universal e atemporal. Outros, de construção restrita a grupos e sociedades menores e sujeitos à temporalidade. Em contraposição, também convivemos com: desconsideração pela vida, egocentrismo, desonestidade, traição, prepotência, manipulação e tantos outros antivalores.
Assim como o corpo humano é habitado por trilhões de micro-organismos – e a sua saúde e a manutenção da vida são garantidas pelas bactérias que o defendem das que o agridem -, povoamos e vivemos em um mundo complexo e, também, como seres de alta complexidade.
Quando habitualmente os nossos instintos primários, animais, aliados a princípios salutares, dirigem o nosso comportamento, produzimos vida. Se somos rotineiramente dominados pelos impulsos primais, e a eles damos vazão pela via dos desvalores, manifestamos pulsões de morte na nossa própria existência, em nosso derredor e na sociedade em que estamos inseridos.
Tal qual a fazenda recebida em herança (anedota contada acima), a nossa vida e o nosso viver necessitam de constante ‘manutenção’ e o nosso potencial carece de constante atualização, pela via dos valores, para se desenvolverem e manifestarem excelência e não se degradarem e serem tragédias, quase sempre, anunciadas”.
WASHINGTON L. TOMÉ DE SOUSA (@washingtontomedesousa – Youtube), bacharel em Direito, ex-diretor da Justiça do Trabalho em Passos, escreve quinzenalmente às quartas, nesta coluna