Dia a dia

Dia a Dia

25 de março de 2023

ADAILTON DE ALMEIDA

Compra-se tempo

Não é incomum a sensação de que as horas estão a cada dia mais curtas, de que o tempo é um recurso escasso nos dias modernos. Esta sensação nos inunda de preocupações, pois, via de regra, não estamos acostumados a esperar.

Sim, impacientes nos tornamos, esperar se tornou uma tarefa insuportável, o imediatismo é uma das leis que rege as convenções do século XXI, e isto de certa forma foi propulsionado pela evolução tecnológica. Cartas e telefonemas cederam às mensagens instantâneas. Compras no estabelecimento? Jamais! Posso entrar em um site e comprar em segundos. Cozinhar pra quê? Posso pedir comida pelo aplicativo do celular.

Ocorre que toda essa comodidade também nos tornou mais acelerados, queremos as coisas “para ontem”. Porém esquecemos que nem tudo está ao nosso alcance, por mais que queiramos as coisas para já, existem os imprevistos e os problemas que demandam mais tempo para serem solucionados.

O que fazer então se o tempo é um recurso escasso e não podemos ter mais do que 24 horas por dia?
Bem, há coisas que não podemos comprar e uma delas é o tempo, se assim o fosse, teríamos mais momentos ao lado dos que amamos.

O que de fato podemos fazer é administrar melhor esse recurso tão valioso, definindo prioridades e aceitando aquilo que não podemos resolver de pronto, pois se não se consegue resolver algo instantaneamente, frustrar-se ou reclamar é uma perda de tempo, e, portanto, contraproducente.

É preciso se atentar também, não apenas à quantidade do tempo que gastamos, mas também à qualidade do tempo empreendido. Gerir o tempo não é algo fácil, por vezes, fatalmente, nos arrependemos de algo que poderíamos ter feito ou deixado de fazer.

Esquecemos, por assim dizer, que o processo é tão importante quanto o fim, o foco cego no resultado nos impede de desfrutar o caminho, é como estar numa condução, ansioso para chegar ao destino, porém, mesmo sentado à janela, não se aproveita a paisagem, e aí, quando finalmente se chega ao destino, o passageiro não se sente plenamente satisfeito, porque projetou expectativas e deixou de viver o trajeto.

Nisto se encaixam várias situações concretas, marcadas pelo desequilíbrio, onde, por exemplo, se é destinado muito tempo para atingir metas no trabalho e pouco tempo para o convívio com a família e amigos.
Existem muitos itinerários que são engolidos pelo tempo, muitas oportunidades e momentos que poderiam ser aproveitados com mais intensidade.

Como passageiros, resta-nos aproveitar a viagem da melhor forma, fazendo uso da paciência naquilo que não depende de nós. Às vezes a porta não se abre com a primeira chave, outras vezes não podemos usar a mesma chave para todas as fechaduras, e não é culpa do chaveiro, às vezes temos que ir testando chave por chave do molho que temos em mãos. Ter paciência é assim mesmo, tatear o interruptor no escuro até que a luz venha.

Como dizia no início, o mundo está de fato acelerado, cercado de facilidades que nos tornam imediatistas, nos deparamos com todo tipo de propaganda a oferecer alguma solução prática, porém aqui termino convicto de que nunca veremos alguma que anuncie “vende-se tempo”.

ADAILTON DE ALMEIDA, escritor. Integra a Associação Cultural dos Escritores de Passos e Região, cujos membros se revezam na autoria de textos desta coluna aos sábados